Saúde

Artigo: Hemofilia: olhar atento para o futuro sem perder o passado de vista

O Brasil tem um Programa Nacional de Atenção robusto e consolidado, que é modelo para outros países. No entanto, é preciso pontuar que a excelente organização estrutural existente não nos isenta de trabalharmos em prol da causa

. -  (crédito: Manusapon Kasosod/Getty Images/iStockphoto)
. - (crédito: Manusapon Kasosod/Getty Images/iStockphoto)

Hoje, 17 de abril, marca o Dia Mundial de Hemofilia, condição genética considerada rara e caracterizada pela incapacidade de coagular o sangue. De acordo com a Federação Mundial de Hemofilia (WFH), o Brasil tem a quarta maior população com hemofilia do mundo, estimada em cerca de 14 mil pessoas. Não à toa, o país tem um Programa Nacional de Atenção robusto e consolidado, que é modelo para outros países. Por aqui, o tratamento das hemofilias é feito exclusivamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS). No entanto, é preciso pontuar que a excelente organização estrutural existente não nos isenta de trabalharmos em prol da causa.

Precisamos chamar atenção para necessidades básicas ainda não atendidas que impactam e até mesmo prejudicam a qualidade de vida das pessoas com hemofilia. Não é raro que pacientes, principalmente aqueles de regiões mais remotas do Brasil, se deparem com muitos obstáculos para diagnóstico, tratamento e atendimento de intercorrências.

Nesse contexto, destacamos as dificuldades na distribuição dos fatores de coagulação em domicílio em alguns estados, que deveriam ser fornecidos em quantidade suficiente para um mês, conforme determina a Coordenação Geral de Sangue e Hemoderivados (CGSH). Na prática, porém, não funciona assim.

Também a falta de acesso a cirurgias ortopédicas para a colocação de próteses nos pacientes que nasceram antes da implementação da profilaxia — e que, por isso, desenvolveram sequelas articulares gravíssimas, que provocam dores insuportáveis — os impede de exercer sua cidadania e inserção social.

Mas os principais e mais urgentes problemas que observamos são a falta de estrutura física e de recursos humanos devidamente capacitados. Pensando neste último, a Federação Brasileira de Hemofilia lançou a carteirinha para pessoas com hemofilia. Trata-se de um documento que é distribuído gratuitamente aos pacientes nos hemocentros. O objetivo é que, em qualquer tipo de atendimento médico, seja apresentado esse documento, junto ao de identificação, de forma a informar à equipe de saúde sobre a condição. Nessa carteirinha, os profissionais terão acesso a um QR Code que direciona a materiais educativos, de manejo e de orientação terapêutica de órgãos oficiais, como o Ministério da Saúde. É uma ferramenta valiosa que visa mitigar os riscos de atendimento inadequado e munir os profissionais de informações técnico-científicas de qualidade.

Apesar dos desafios ainda existentes, não podemos deixar de pontuar avanços significativos: a implementação da profilaxia primária e secundária para hemofilia grave, o aumento da disponibilidade de doses domiciliares para o período de um mês (anteriormente, menor), a ampliação da faixa etária para o uso de fator VIII recombinante para o tratamento de hemofilia A, a criação da Frente Parlamentar na Câmara dos Deputados, a incorporação de anticorpo monoclonal no Sistema Único de Saúde (SUS), entre outros.

Mais recentemente, celebramos o fato de a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) ter aprovado a primeira terapia gênica para o tratamento de adultos com hemofilia A grave. Apesar da alternativa se somar ao arsenal terapêutico existente, ampliando a gama de opções e proporcionando tratamentos cada vez mais personalizados em concordância com a tendência mundial de assistência à saúde, ainda existem muitas etapas regulatórias a serem cumpridas até estar, de fato, acessível aos pacientes que são elegíveis a esse tipo de tratamento.

Mas ainda há muito o que fazer para sanar todos os problemas enfrentados pela comunidade de hemofilia. Por isso, é razoável que, em todas as instâncias de governo, poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, a tripartite — federal, estadual e municipal — se unam e se responsabilizem em suas áreas de atuação, pois temos a Política Nacional de Atenção bem desenhada, e referência mundial.

Neste Dia Mundial de Hemofilia, é fundamental termos fresco na memória a luta árdua pelos avanços conquistados e consolidados até aqui para que, vislumbrando o futuro, não percamos o foco daquilo que realmente importa: a promoção e manutenção da qualidade de vida dos pacientes.

*Tania Maria Onzi Pietrobelli, presidente da Federação Brasileira de Hemofilia (FBH)

Gostou da matéria? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:
Ícone do whatsapp
Ícone do telegram

Dê a sua opinião! O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores pelo e-mail sredat.df@dabr.com.br

postado em 17/04/2024 06:00
x