O hidrogênio verde, combustível de carbono zero obtido por meio da eletrólise da água, tem se destacado como importante elemento para a diversificação da matriz energética em grandes discussões globais, como o Fórum Econômico Mundial e a COP, onde a neoindustrialização e a descarbonização têm sido abordadas.
Considerando a preocupação mundial com a crise climática e as alternativas existentes, muitos países têm decidido investir em uma nova indústria, mais limpa e com alto potencial de desenvolvimento.
O Brasil tem grande vantagem na largada da corrida pelo H2V, como o hidrogênio verde é conhecido, pois possui 90% de sua matriz energética renovável; uma das maiores do mundo. Isso é um grande diferencial e uma das razões pelas quais o Brasil já tem mais de 50 Memorandos de Entendimento assinados, sendo 35 deles no Nordeste, região com maior geração de energia limpa.
Apesar do claro interesse na região, engana-se quem pensa que os benefícios advindos do hidrogênio verde ficarão restritos ao Nordeste. Investimentos irão apoiar toda uma cadeia de valor, uma vez que o H2V pode e será utilizado em diversas outras indústrias, como fertilizante, aço, cimento e mineração, entre outras, por todo o país. Além disso, investimentos se traduzem em desenvolvimento, e incentivar essa nova indústria significa contribuir diretamente para a geração de empregos, arrecadação e "neoindustrialização".
A produção de hidrogênio verde é extremamente tecnológica e não seria exagero chamarmos uma planta de H2V de refinaria verde do futuro, já que ela transforma a água, o vento e outros elementos em combustível. Portanto, estamos diante de uma grande oportunidade de termos refinarias de combustíveis verdes no país. Além do alinhamento aos planos de governo, trata-se de uma questão de soberania nacional: nos tornarmos independentes na produção de novos combustíveis limpos.
É com o objetivo de concretizar essas oportunidades e criar condições ao desenvolvimento de uma indústria de alto valor agregado e com demanda estabelecida que a Associação da Indústria do Hidrogênio Verde (ABIHV) tem trabalhado junto ao poder público na busca por estrutura e incentivos. Acreditamos que o Brasil precisa aproveitar o momento e a sua posição favorável para modernizar seu parque industrial, sob o risco de ficar para trás na economia global, uma vez que o mundo já começa a criar barreiras para produtos produzidos com alta emissão de carbono.
Segundo estudos encomendados pela ABIHV, os números são bastante favoráveis: a expectativa é de que, até 2030, o setor tenha 8GW em construção, gerando 40 mil empregos. Nesse cenário, com incentivos estimados em R$ 11 bilhões, valor suficiente para tornar o H2V competitivo e viabilizar os primeiros projetos, as empresas devem aportar R$ 388 bi em investimentos, resultando em superavit para o Poder Público de R$ 78 bilhões. Isto é, o valor arrecadado vai ser 700% maior que o destinado ao incentivo. Se considerarmos 2050, o superavit sobe para R$ 790 bilhões, com o impacto positivo no PIB podendo chegar a R$ 7 trilhões. Números que evidenciam que incentivos do governo são, na verdade, investimentos com retorno largamente superavitário. Ainda vale esclarecer que os incentivos para o hidrogênio verde serão atrelados à efetiva produção, garantindo a geração de empregos e arrecadação de impostos com a construção dessas imensas refinarias verdes. E os incentivos virão somente após a instalação das estruturas, zerando os riscos para a União e garantindo que não haverá gasto público nos próximos dois a três anos, período para a execução dos primeiros projetos.
Diante dos pontos aqui apresentados, parece óbvio qual caminho o Brasil deveria escolher. Isso porque enquanto diversos países têm investido em sua infraestrutura e criado subsídios, o Brasil dá alguns passos, mas ainda carece de propostas arrojadas e concretas de políticas de incentivo para que possamos tirar projetos do papel.
Os EUA, por exemplo, assinaram o Inflation Reduction Act (IRA), um pacote de gastos de mais de US$ 350 bilhões em energia e clima, com incentivos de até US$ 3 por quilo de hidrogênio produzido. Já a União Europeia conta com iniciativas de fomento à indústria, como o Fundo de Inovação do Hydrogen Bank, que disponibilizará 3 bilhões de euros, por meio de leilões, para o desenvolvimento do mercado.
A verdade é que, por mais que o Brasil seja um grande produtor de energia renovável, sem incentivos que acompanhem os investimentos privados, a indústria do H2V no país não será competitiva. Trata-se de uma tecnologia nova e, portanto, carece de investimentos para que tenha escala e, consequentemente, redução gradual da curva de aprendizagem e custos. E lembremos que essa não é uma particularidade do H2V. Para que indústrias consolidadas, como eólica, solar, álcool e até petróleo, pudessem se desenvolver e serem competitivas, foi necessário implementar programas de incentivo ao longo de décadas. A boa notícia é que em lugares com energia renovável de alta qualidade, como no Brasil, estudos internacionais projetam que o H2V chegará ao mesmo preço do hidrogênio de origem fóssil (cinza) já em 2030.
Com tantos países e empresas interessados no hidrogênio verde, fica cada vez mais urgente que o Brasil tome uma decisão célere sobre qual caminho deseja seguir e, mais do que isso, tome atitudes. Novamente, a escolha parece óbvia. No entanto, se o Brasil continuar nesse ritmo, ficará sem opção muito em breve.
Luís Claudio Viga - Presidente do conselho da ABIHV, Associação Brasileira da Indústria do Hidrogênio Verde
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