Segurança

O uso de bodycams além das polícias

A medida reduziu o número de incidentes em mais de 30% nas lojas do Grupo Carrefour Brasil

No início de 2024, o uso de câmera corporal por forças públicas de segurança ganhou o noticiário brasileiro. Não é de hoje que as polícias do país utilizam o equipamento — já são 26 estados a adotá-lo ou preparar a adoção, segundo o Ministério da Justiça e Segurança Pública. E agora o mesmo ministério tem no forno um projeto de lei que busca institucionalizar a chamada bodycam como item do equipamento de proteção individual dos policiais. A discussão tem ficado em uma possível dicotomia entre liberdade policial e transparência, tema para especialistas em segurança pública. Paralelamente, não se trouxe à tona o debate sobre o uso de câmeras corporais pela iniciativa privada.

Lá se vão quase 20 anos desde que a Europa começou a utilizar câmeras nos uniformes policiais. Na iniciativa privada, uma varejista britânica, com 2.800 lojas no Reino Unido, tem forte adesão — onde o foco é a proteção dos funcionários. No Japão e em Hong Kong, há o uso em categorias de servidores não policiais — como maquinistas de trem (Japão) e fiscais de ambulantes (Hong Kong). Aqui no Brasil, o primeiro uso em larga escala na iniciativa privada é do Grupo Carrefour Brasil, com investimento de R$ 16 milhões para a implementação do uso de bodycams em sua operação brasileira, em mais de 800 lojas — a exceção fica para lojas onde não há os denominados fiscais de prevenção (as menores, como as em condomínios).

A iniciativa visa a dar mais transparência para as interações entre colaboradores e clientes, acompanhando a aderência dos funcionários aos protocolos de atuação estabelecidos pela companhia. A medida reduziu o número de incidentes em mais de 30% nas lojas do grupo, mostrou um levantamento realizado em 150 unidades com a solução implantada havia quatro meses ou mais, comparando o mês de julho (sem câmeras) a dezembro (com câmeras por esse período).

Ao todo, 4 mil equipamentos estão sendo utilizados por fiscais de prevenção (que trabalham dentro das unidades) e seguranças externos das lojas. Estes últimos, terceirizados por força de lei, usam câmeras compradas por nós - e as empresas que os contratam passaram a ser obrigadas a utilizar as bodycams após reformulações de contratos, o que impede qualquer edição ou eliminação das imagens.

A implementação das bodycams faz parte de um intenso processo de mudança de cultura. Pois, sim, o Grupo Carrefour Brasil teve casos de violência e racismo em lojas, casos trágicos que jamais deveriam ter acontecido. E também por este motivo, assumimos nossa responsabilidade e nos colocamos como parte da solução. Entendemos que esse é um processo amplo que envolve, especialmente, a mudança de cultura. Para nós ela acontece em três frentes principais e que se complementam: Treinamento, Política de Consequência e Transparência. Isso tudo é parte de um compromisso maior em construir um futuro mais inclusivo, diverso e mais sustentável.

A implantação de bodycams pela iniciativa privada não tem como gerar discussão, se bem implementada. Os fiscais de prevenção, como o nome do cargo aponta, estão ali para prevenir. Eles obrigatoriamente têm de atender bem os clientes. Os seguranças, que também devem atender bem, estão para impedir algum malfeito a clientes e colaboradores e, só depois, à empresa. Vale ressaltar que todas as relações precisam ser pautadas pelo respeito sempre. E quando há um possível crime, a polícia deve ser acionada.

Há inúmeras razões para a iniciativa privada adotar as câmeras. A queda de mais 30% de ocorrências identificadas é um primeiro exemplo da efetividade da ação. Transparência, consequências justas e treinamento são etapas mais do que importantes. São essenciais.

As grandes empresas precisam entender sua responsabilidade e tamanho para endereçarem ações inovadoras, que possam conduzir o varejo, e a iniciativa privada como um todo, a um novo patamar. Inclusive no que diz respeito a protocolos de atuação dos funcionários. As bodycams não têm o poder de zerar os incidentes de conflitos e até violência, infelizmente inevitáveis quando há milhões e milhões de pessoas transitando, por exemplo, por lojas. Entretanto, são hoje uma efetiva ferramenta para reduzir casos de violência, uma ferramenta a ser combinada com educação, capacitação, persistência de ações benéficas e disposição em melhorar.

MARCELO TARDIN

Diretor-executivo de Transformação do Grupo Carrefour Brasil

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