Transição energética

Energia limpa também é espaço para a nova política industrial

A proposta do governo entende que os geradores de energia renovável, entre os quais solar e eólica, devem acelerar o processo de substituição das fontes de combustíveis fósseis na matriz de suprimento de energia da indústria nacional

ARTHUR SOUSA
Membro do Movimento Empresarial pela Inovação da CNI e Conselheiro do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA)


A nova política industrial inclui no escopo da 5ª missão para a Nova Indústria Brasil (NIB) metas de investimentos em bioeconomia, descarbonização, além de transição e segurança energética. A proposta do governo entende que os geradores de energia renovável, entre os quais solar e eólica, devem acelerar o processo de substituição das fontes de combustíveis fósseis na matriz de suprimento de energia da indústria nacional.

Entretanto, a própria base instalada de geração renovável, solar e eólica, é, em si, um novo espaço para o desenvolvimento de uma longa cadeia industrial de bens e serviços, que pode ser imediatamente fomentada e com resultados de grande impacto na geração de riqueza e na geração de salário e renda. A base industrial para a produção de itens para o setor eólico já foi maior do que é atualmente, mas pode voltar a ter relevância. Estamos falando de um setor que está em todos os estados da federação e que representa fatia importante da matriz de geração elétrica.

O segmento da energia solar é a segunda fonte de geração de energia elétrica do país, ficando atrás apenas das usinas hidrelétricas. É a fonte que mais cresce em termos de oferta de energia para o Sistema Interligado Nacional (SIN). Hoje, há mais de 3,3 milhões de unidades consumidores de energia solar no Brasil. Os investimentos na chamada geração solar já alcançaram R$ 181 bilhões em investimentos, geraram 1,1 milhão de empregos desde 2012 e contribuíram para evitar a emissão de 50 milhões de toneladas de CO² na atmosfera, segundo dados da Absolar, a associação do setor. Boa parte desses resultados viabilizados por investimentos da indústria que busca fontes renováveis para sua matriz de suprimento de energia.

Considerando apenas a geração solar, a indústria instalada para fornecimento de todos os bens e serviços necessários deve ser estimulada na nova política industrial. Dados compilados pelo BNDES no ano passado mostram o tamanho da oportunidade que o Brasil tem para criar um cluster sul-americano de fornecimento de equipamentos para geração solar distribuída.

Segundo o banco de fomento, 145 empresas consolidadoras de sistemas solares fotovoltaicos (que montam os chamados kits) estão cadastradas no Finame. Há ainda, segundo o mesmo levantamento, 11 empresas fabricantes/importadoras de inversores (equipamento fundamental para que o pequeno gerador possa injetar excedente de energia na rede local, quando a geração de eletricidade nos painéis supera a própria demanda), outras 12 para equipamentos de rastreamento solar, mais oito para módulos fotovoltaicos e mais cinco de baterias.

Portanto, estamos diante da possibilidade de criar uma via de mão dupla. A geração de energia renovável, centralizada ou distribuída, de fonte solar ou eólica, pode e irá apoiar o processo de substituição de fontes fósseis na indústria. Mas o destaque que faço aqui está no fato de o próprio setor de geração de energia renovável ter uma política industrial que fomente a construção de uma base industrial que servirá não apenas ao Brasil, mas será referência em toda a América Latina. O Brasil é uma potência de geração de energia renovável, poderá ser também uma potência industrial para o setor de energia renovável.

Não há dúvida que o atual estágio do setor de nova geração renovável já instalada no Brasil terá capacidade de cumprir as metas e os desafios da 5ª missão do NIB, entre as quais reduzir em 30% a emissão de CO² da indústria brasileira, aumentar o uso de tecnologia no campo do suprimento energético para a Indústria 4.0 ou mesmo reduzir a dependência externa de equipamentos para a produção de energia renovável.

A geração distribuída, que hoje tem uma base instalada de 26 GW, mais de duas Itaipus, deverá ser de 40 GW até o final de 2027. Isso sem falar dos parques centralizados de geração solar, que também vão demandar bens e serviços nos próximos anos. Esse movimento também viabiliza investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), criando ambientes novos de incentivo tecnológico para o aprimoramento de equipamentos e outras frentes, como, por exemplo, o armazenamento de energia em baterias, algo que será fundamental para o país.

A indústria brasileira é beneficiária da geração renovável, mas é hora de uma nova política industrial para a criação de um cluster industrial das renováveis. O Brasil é uma potência ambiental e pode ser uma potência industrial das renováveis. Se a ideia do governo é o desenvolvimento industrial, pensemos ele em toda a dimensão possível.

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