CESAR VICTOR DO ESPÍRITO SANTO
Engenheiro florestal, conselheiro do Conama e membro da Funatura, da Rede Cerrado e da Remap
Na semana passada, aconteceu, em Brasília, a Oficina de Trabalho: Critérios e Priorização para a Criação de Unidades de Conservação Federais promovida pelo ICMBio. Foi um evento muito importante por ter tratado de um tema extremamente relevante e, infelizmente, abandonado nos últimos anos. Foi muito gratificante ter reencontrado pessoas que trabalham com o tema ou vivem em áreas onde há o aproveitamento sustentável dos recursos naturais, de várias partes do Brasil, de todos os biomas, do Cerrado, do Pantanal, da Caatinga, da Mata Atlântica, dos Pampas e da Amazônia, além da Zona Costeira e Marinha.
Até meados do ano passado, a última unidade de conservação federal criada foi em 2018. Há inúmeros (mais de 200) estudos e propostas de criação e/ou ampliação de UCs federais desenvolvidos nos últimos 15 anos, que simplesmente foram engavetados e que, agora, estão sendo objeto de reavaliações sobre a pertinência ou não de serem criadas, uma vez que a situação das áreas já não é a mesma da época em que foram propostas.
Muitas destas áreas estão situadas em áreas consideradas de extrema importância para a biodiversidade, para a produção de água, para a manutenção de paisagens únicas, para o seu aproveitamento sustentável por comunidades tradicionais, dentre outros aspectos. O problema é que quanto mais o tempo passa, mais as áreas vão sendo impactadas e alteradas, acarretando, em muitos casos, a inviabilização de sua criação ou ampliação tal como foram propostas na época dos estudos.
No Cerrado, a situação é dramática e não se pode perder mais tempo. O rápido avanço da conversão do Cerrado nativo em outros usos, especialmente pelo agronegócio (principalmente para a produção de soja, milho e carne) está destruindo áreas de extrema importância, além de acarretar o processo de insularidade das unidades de conservação (UC) existentes, diminuindo o objetivo maior das UCs, que é a conservação da natureza no longo prazo, melhor dizendo, para sempre.
De 2019 a 2023, houve um aumento constante do desmatamento no Cerrado, atingindo mais de 11 mil km² em 2023, conforme dados do Prodes/Inpe. Nas últimas seis décadas, o Cerrado já perdeu metade dos seus ecossistemas naturais. A continuar neste ritmo, com mais 50 anos, vamos ter apenas as UCs e demais áreas protegidas, como as terras indígenas, para contar a história. Atualmente, o bioma tem apenas 8,62% de sua superfície em UCs, sendo 3,07% em unidades de proteção integral e 5,55% em unidades de uso sustentável.
O que me deixou frustrado com a Oficina de Trabalho foram as propostas de prazos do MMA para a criação/ampliação de UCs, com previsões somente para 2026 e 2030. Por que isso? Se considerarmos a velocidade com que o Cerrado está sendo destruído, vamos constatar que estudos podem ter a necessidade de serem atualizados em um prazo de menos de dois anos, ou seja, uma proposta bem embasada e apresentada hoje, se não for logo colocada em consulta pública e, na sequência, ter um trâmite protocolar cumprido dentro de um tempo razoável, a possibilidade de criação de novas UCs será praticamente inexistente. Por isso. afirmo: o Cerrado tem pressa e não pode esperar!