JESSICA DOUMIT, diretora de relações institucionais da Eureciclo e diretora presidente do Instituto Giro
É provável que 2023 fique marcado na história enquanto importante ponto de inflexão — um turning point — na consciência global em relação à questão climática, diante dos eventos extremos registrados em variados biomas e países ao longo do ano passado, afastando definitivamente a pauta como distante da realidade. Estive nos Emirados Árabes para participar da COP28 (28ª Conferência de Mudanças Climáticas da Organização das Nações Unidas), realizada com grande expectativa entre os dias 30 de novembro e 12 de dezembro de 2023, em Dubai, sendo que a delegação brasileira foi a maior dentre todas registradas, com mais de 1.300 pessoas. Entre as inúmeras experiências enriquecedoras durante a COP 28, começo destacando o painel sobre transição energética conduzido por Marisa Maia de Barros, subsecretária de Minas e Energia da SEMIL/SP, no qual discorreu com acuidade sobre o uso de biomassa e biometano, produzido, inclusive, a partir dos resíduos que são gerados em aterros.
Outro ponto alto da visita à cúpula climática foi a oportunidade de visitar a maior planta de "waste to energy" do mundo, que produz de energia a partir dos resíduos urbanos de Dubai, com capacidade de processar 5.500 toneladas de resíduos urbanos diariamente, o equivalente a aproximadamente 45% do volume de resíduos gerados na cidade. Até 2030, a intitulada Dubai Waste to Energy poderá tratar 80% de todo o volume gerado em Dubai, suprindo o consumo de 120 mil residências por ano e colocando a cidade no mapa da bioeconomia do futuro.
Foi de grande valor a realização do painel de lançamento do programa "Cidades Verdes Resilientes", com a participação do Adalberto Felicio Maluf Filho e Marina Helou, cujo objetivo é integrar e otimizar os esforços em políticas urbanas e climáticas para melhorar a qualidade ambiental, e o lançamento da plataforma de créditos de reciclagem de Dubai, muito complementar à da eureciclo. Também visitei a chamada Green Zone, onde acontece uma aglomeração e participação popular, e estive no evento do Pacto Global da ONU, sobre os Fundos para Aceleração da Transição Energética no Brasil.
Neste contexto dos zoneamentos climáticos pela cidade, a BlueZone esteve sob a gestão da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC) e serviu como centro para negociações oficiais e reuniões com debates pertinentes, aprofundados e de alto nível; no entanto, é reservado a participantes credenciados, incluindo representantes governamentais, negociadores, observadores e meios de comunicação. É o epicentro da tomada de decisões sobre políticas e acordos climáticos internacionais. Também são muito funcionais as estações de água potável para encher a garrafa reutilizável e o metrô liberado para os participantes, incentivando o transporte coletivo em detrimento do individual.
Acompanhei uma plenária muito rica que debateu o artigo 6º do Acordo de Paris, sobre as regras básicas para o funcionamento dos instrumentos de mercado de carbono e como incentivar a redução das emissões de gases de efeito estufa, promovendo o desenvolvimento sustentável, estimular a participação de entidades públicas e privadas na mitigação das emissões, e buscar a mitigação global das emissões. Outro painel de destaque, "Desafios e oportunidades na promoção de uma circularidade e inovação na indústria", também pode ser conferido na íntegra a partir de 01:44:00 aqui https://lnkd.in/dCUHjbY2.
Os palestrantes destacaram durante o painel a importância do rastreamento para a lisura de toda cadeia de reciclagem (importante forma de combater o greenwashing) e como uma legislação clara e transparente traz indicadores, reduz desperdícios, gera eficiência, otimiza processos e torna a indústria mais competitiva. Os desafios a serem enfrentados nessa década são imensos, mas por meio de conferências de caráter global e de integração como a COP-28, é possível estudar, indicar e se aprofundar nas saídas possíveis à urgência de uma revisão nos padrões de consumo, uso de combustíveis fósseis, descarte de resíduos e outros temas pertinentes.
Durante a cúpula, foram realizados importantes debates e painéis sobre manejo correto de resíduos sólidos e reciclagem no contexto da bioeconomia, que ganha força gradativamente em resposta às novas demandas da sociedade. Soma-se a isso a urgência da gestão de resíduos sólidos e aplicação de logística reversa e reciclagem em escala global, além de uma necessária revisão nos padrões de consumo, onde todos os padrões até hoje aceitáveis passam a ser repensados. Nesse intuito, buscamos, hoje, uma sociedade mais equânime e equilibrada, onde a questão ambiental não anda apenas a reboque da economia, mas antes uma bússola e um aliado.