» Thais Maria Riedel de Resende Zuba, doutora em direito constitucional, mestre em direito previdenciário e presidente da Associação Confederativa Brasileira da Advocacia Previdenciária
Hoje, dia 24 de janeiro, comemoramos o Dia do Aposentado. É a data que celebra quem já dedicou parte da sua vida a trabalhar, contribuir com a construção de uma sociedade mais próspera e, agora, pode descansar. E como sabemos, no Brasil, o sistema é contributivo, regido pelo princípio da solidariedade e firmado em um pacto intergeracional (entre gerações). Enquanto uma geração trabalha, contribui para que outra usufrua da aposentadoria.
Esse sistema — que foi ampliado pela Constituição de 1988 e tem como objetivo proteger a sociedade contra os riscos sociais, como a doença, o acidente, a morte, o desemprego, a maternidade e a idade avançada — corre perigo de colapsar. Ocorre que o Sistema de Seguridade Social do Brasil, como em todos os países, é fruto de suas condições históricas, econômicas e culturais. Até a Constituição de 1988, não havia um sistema integrado que abordasse o assunto nas suas vertentes principais: assistência, previdência e saúde.
Foi a Constituição Federal de 1988 que estipulou a universalização do acesso à saúde, a assistência social aos necessitados e a previdência a todos que trabalham. Apontou, também, as fontes de financiamento, sendo que a maior parte vem da folha de pagamento, mas não só. Contribuem com o financiamento da previdência o faturamento e o lucro das empresas, a arrecadação dos jogos de apostas (concursos de prognósticos) e também as contribuições sociais sobre a importação, entre outros.
Na década de 1990, a América Latina foi atingida por diversas crises financeiras que desencadearam uma onda de recessão, obrigando os países a buscarem recursos em instituições internacionais que impuseram uma série de medidas neoliberais para oferecer socorro. Tais ações tornaram o acesso mais difícil e os benefícios, menores.
Somam-se a isso os avanços tecnológicos que vêm substituindo de maneira rápida trabalhadores por sistemas automatizados, sucessivas crises que têm gerado o aumento de desemprego, a ampliação do trabalho informal e a "pejotização" do trabalho. Essa combinação desequilibra o sistema. Pesquisa recente apontou que apenas 52% dos brasileiros contribuem com o INSS, e os jovens são os que menos contribuem e são os mais expostos aos riscos.
A resposta governamental a esse estado de coisas ainda é muito aquém do que se precisa para solucionar o problema. O que temos visto é uma série de reformas da Previdência desde o início da década de 1990, feitas muito mais para resolver um problema financeiro do Estado do que realmente para manter o espírito trazido pela Constituição, que é proteger o cidadão contra os riscos sociais. Aprimorar a arrecadação e a gestão do orçamento da Seguridade Social, como também a fiscalização de ilícitos e desvios, é um caminho para prevenir as situações de risco no ambiente de trabalho. No lugar disso, temos reformas legislativas sendo feitas em partes, sem olhar o todo do sistema de Seguridade Social.
A última reforma constitucional da Previdência foi realizada há quatro anos e, até hoje, segue sem a regulamentação infraconstitucional devida. É reflexo de uma condição cultural brasileira de não dar a devida importância para um tema tão sensível quanto a aposentadoria.
A regulamentação e a sistematização de todas as normas, leis e princípios relativos à Previdência em um código previdenciário nacional resultariam em mais segurança jurídica e a possibilidade de trazer elementos científicos atuariais para a definição adequada de regras e cálculos de benefícios. Também evitariam que um contingente tão grande de pessoas, como temos hoje, fosse para a inseguridade social. É necessário, ainda, estimular uma cultura previdente, em que tenhamos um sistema contributivo adequado para financiar uma justa aposentadoria a todas as pessoas que trabalham.
Que o Dia do Aposentado sirva de reflexão sobre a sociedade que queremos: uma ordem social capaz de efetivamente proteger as pessoas contra as situações de risco e garantir bem-estar à população na idade avançada ou um sistema desatualizado com os novos riscos globais, que protege cada vez menos e se torna cada vez mais dependente da assistência social?