Já perdi as contas de quantas vezes escrevi sobre esse tema do ano passado para cá. Volto porque sei que não é (nem tão cedo será) suficiente. Mulheres estão morrendo — aos montes, com avisos e ameaças, apesar de denúncias e de medidas protetivas. Não falta informação sobre os feminicídios. Tampouco estatísticas alarmantes. Não faltam denúncias, nem corpos femininos mortos e mutilados, nem famílias destruídas, nem órfãos.
Já foram três assassinatos em Brasília em 17 dias neste ano. Em 2023, 34 — um recorde. Não faltam canais de atendimento, leis, iniciativas reparadoras, como auxílio financeiro para órfãos. Mas nada tem sido suficiente para brecar a fúria ensandecida dos machos assassinos. O que é preciso, afinal?
Talvez maior articulação entre os órgãos governamentais, entre a polícia e a Justiça. É preciso também uma compreensão mais aprofundada sobre o momento em que vivemos. Um estudo social possivelmente mostre que, acuados pela força do feminismo, que tem mostrado a sua cara, os machistas queiram provar sua hegemonia e poder sobre os corpos femininos por meio da violência.
Penso que está na hora de uma campanha massiva e inteligente, que venha acompanhada de uma rede de proteção abrangente para despertar a confiança das mulheres nas instituições e em sua capacidade de resguardá-las. Está na hora de ir para as ruas também por todas nós.
Penso ainda no nosso trabalho de formiguinha, plantando as sementes em nossas filhas, mães, amigas, sobrinhas, colegas, contra o abuso, às vezes extremamente difícil de ser reconhecido pelas mulheres — que chegam a justificar comportamentos abusivos e têm vergonha de aceitar e compartilhar a verdade.
O poder de manipulação dos agressores é imenso. Afeta a autoestima, induz ao medo. Pela proteção dos filhos, pelo pavor de não ter mais nada, pelas ameaças, as mulheres se calam, mas nem quando denunciam estão a salvo. São perseguidas e, com frequência absurda, mortas.
As escolas têm papel fundamental também. Precisam ajudar os pais e também ensinar as meninas a terem uma postura capaz de reconhecer, desde o início, os comportamentos inadequados. Sabemos como tudo começa. A primeira demonstração chega com um pedido de desculpas depois. A segunda com a justificativa de que a pessoa tem ciúmes porque ama. A terceira vem com “foi culpa da bebida, não vai mais acontecer”. E por aí vai.
Nós conhecemos o enredo e o fim triste e dramático de várias histórias assim. Vamos meter a colher, o garfo, os dentes nas relações abusivas. Vamos ensinar as meninas desde cedo a não tolerar nenhuma forma de violência. Se a sociedade não cobrar e se mobilizar de verdade, não vamos conseguir brecar essa violência crescente.