O Fórum Econômico Mundial, que ocorre em Davos, nos Alpes Suíços, vai se dedicar aos temas que envolvem a transição climática e a ponte para uma economia que descarboniza sua geração de riqueza, sob pena de não mais haver retorno na elevação da temperatura do planeta e na ameaça a milhões de seres humanos no futuro próximo. Gerar empregos, fazer da inteligência artificial o motor para a economia e para a sociedade, a segurança e a cooperação em um mundo fragmentado, e, obviamente, uma estratégia para o clima e a energia são os temas do Fórum, que, entre chefes de Estado, presidentes de empresas, representantes da sociedade civil, meios de comunicação e líderes juvenis, deve reunir 2.500 pessoas nos dias de debate.
Vista como menos urgente do que as mudanças climáticas, mas tão necessária quanto, a desigualdade social não estará no foco direto das discussões, sobretudo porque um dos seus maiores defensores atuais, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, não participará do evento. Ao jogar o Fórum Econômico para segundo plano, Lula perde a primeira janela internacional para pôr em prática a prioridade fixada para sua gestão à frente do G20: de combate à fome e à desigualdade social.
Ao deixar a representação do Brasil em Davos 2024 como responsabilidade da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, do ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira, e do assessor especial da Presidência, Celso Amorim, o governo brasileiro prioriza as mudanças climáticas em detrimento de uma agenda social. Isso exatamente no momento em que um estudo da Oxfam mostra que o mundo está perto de ter os primeiros trilionários até 2033, enquanto para erradicar a pobreza serão necessários 230 anos. E a aposta da Oxfam está exatamente no Brasil para encabeçar a demanda de se fixar metas de redução da desigualdade, assim como há metas para redução da emissão dos gases do efeito estufa.
Os dados do relatório Desigualdade S.A — Como o poder corporativo divide nosso mundo e a necessidade de uma nova era de ação pública, divulgado na segunda-feira, mostram que a fortuna das cinco pessoas mais ricas do mundo mais do que dobrou no ano passado, enquanto a renda de 5 bilhões de pessoas no mundo diminuiu. Pelo menos quatro dos cinco bilionários brasileiros mais ricos aumentaram em 51% sua riqueza desde 2020. Nesse período, outros 129 milhões de brasileiros ficaram mais pobres. A desigualdade social no mundo e no Brasil é gritante e está na origem da crise migratória nas Américas e da África para a Europa, assim como da fome a que estão condenados milhões de seres humanos.
A Oxfam estima que, se apenas os recursos usados em dividendos e recompra de ações para os 10% mais ricos em 2022 fossem redistribuídos aos 40% mais pobres, a desigualdade teria uma redução de mais de 20%. E, ainda, se metade do valor pago aos 10% mais ricos em 2022 fosse distribuído, seria suficiente para acabar com a pobreza global (US$ 6,85 por dia). Para a entidade, grandes empresas e monopólios estão aumentando a desigualdade social em toda a economia, sendo necessária uma ação dos governos de fortalecimento dos serviços públicos para a população e de cobrança de impostos sobre grandes fortunas e a parcela dos mais ricos, no sentido de aumentar a distribuição de renda e combater a desigualdade.
No Brasil, a desigualdade vem de longa data, hora tendo pequenas reduções, hora avançando. Na década de 1970, com o milagre econômico, se criou o conceito de que era preciso fazer o bolo crescer para, depois, distribuir, e o economista Edmar Bacha cunhou a expressão "Belíndia", para mostrar a proximidade do Brasil rico com a Bélgica e a parcela pobre com a Índia. A representação precisa ser atualizada. Não porque a realidade brasileira mudou, mas porque os países que foram referência no passado mudaram. A retomada dos programas sociais ajuda a diminuir a desigualdade, mas de forma ínfima. É preciso que as nações, e em especial o Brasil, adotem medidas para efetivamente combater a desigualdade, com estabelecimento de metas a serem cumpridas.