Equador

Segurança pública e o fracasso dos governos neoliberais no Equador

Caracterizada por uma dupla dependência econômica, do dólar e dos recursos do petróleo, a difícil crise de segurança pública no Equador parece estar longe de terminar

» Gustavo Menon, docente no Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina da Universidade de São Paulo (Prolam-USP) e coordenador do curso de relações internacionais da Universidade Católica de Brasília (UCB)


O Equador retorna às manchetes devido à crise generalizada na segurança pública do país. Na última terça-feira, homens armados e mascarados invadiram os estúdios do canal TC Televisión, em Guayaquil, expondo cenas de terror que têm marcado a realidade nacional nos últimos anos. Equipados com bombas, pistolas e outras armas, vários trabalhadores foram feitos reféns durante a transmissão ao vivo do programa El Noticieiro. Pessoas em shoppings, instalações públicas, universidades e hospitais tiveram que retornar rapidamente aos seus lares.

O país enfrenta uma crise de segurança desde o término do mandato de Rafael Correa, que deixou o governo em 2017. Desde então, várias máfias e vários grupos narcotraficantes assumiram o controle do sistema prisional, influenciando a vida da população equatoriana em meio a políticas de austeridade reativadas desde a sucessão da chamada "Revolução Cidadã", projeto liderado pelos governos progressistas de Correa entre 2007 e 2017.

Devido ao desgaste institucional, especialmente após o desmantelamento de certos cartéis no México e na Colômbia, essas máfias viram no Equador um terreno fértil para a disputa de território. A crise na segurança pública é evidente, com mais de 460 mortes em confrontos no sistema prisional desde 2021. Além disso, os homicídios nas ruas aumentaram quase 800% de 2018 a 2023.

Anteriormente considerado um país relativamente seguro, o Equador testemunhou uma escalada de violência devido ao desgaste das instituições públicas associadas às infiltrações do crime organizado no sistema político e judicial.

Vale ressaltar que o atual presidente, Daniel Noboa, assumiu o Poder Executivo durante a chamada "morte cruzada", quando o então presidente Guillermo Lasso dissolveu a Assembleia Nacional em meio à decomposição institucional, em uma tentativa malsucedida de conter a espiral de violência. Anúncios frequentes de Estado de Exceção e políticas de privatização têm proporcionado pouco êxito na melhoria da segurança pública.

O clima de terror foi evidente nas eleições de 2023, quando o candidato à Presidência Fernando Villavicencio foi assassinado a tiros durante a campanha eleitoral. Agustín Intriago, prefeito da cidade de Manta, também foi morto durante seu mandato.

Nesse cenário, líderes de facções criminosas conseguiram escapar das prisões devido à completa ausência do poder público. A fuga de José Adolfo Macías Villamar (Fito), líder do grupo narcotraficante chamado Los Choneros, agravou ainda mais a crise nas últimas horas. Outros integrantes do crime organizado também escaparam do sistema carcerário.

Relatos indicam que sete policiais foram sequestrados durante o Estado de Exceção declarado por Noboa na segunda-feira. Há mortes e alguns feridos. Em Quito, um veículo explodiu, e um dispositivo foi detonado perto de uma ponte de pedestres. Diante de tal "crise de segurança sem precedentes", o prefeito da capital equatoriana, Pabel Muñoz, solicitou a "militarização" de instalações estratégicas ao Executivo.

O novo presidente, eleito com uma plataforma anticriminalidade, decretou um toque de recolher de seis horas, das 23h às 5h. Instalações públicas, como o palácio presidencial e as estações de metrô de Quito, foram militarizadas. A declaração de Estado de Exceção, além de suspender garantias constitucionais, permitiu às Forças Armadas intervir no sistema prisional, marcado por rebeliões nos últimos anos.

"Nós não vamos negociar com terroristas, nem descansaremos até devolvermos a paz aos equatorianos", declarou Noboa em vídeo publicado nas suas redes sociais. No entanto, o agravamento da crise se deve às disputas entre facções pelo controle de territórios. O Ministério da Educação suspendeu aulas presenciais em todo o Equador, e as Forças Armadas foram mobilizadas para tentar desmantelar mais de 20 grupos do crime organizado listados no Decreto Presidencial n. 111/2024. O decreto reconhece a existência de um conflito interno armado, além de classificar os grupos criminosos como terroristas, ampliando o uso da força por parte das Forças Armadas.

Noboa anunciou, recentemente, a construção de dois presídios de segurança máxima nas províncias de Pastaza e Santa Elena, seguindo o exemplo do mandatário salvadorenho, Nayib Bukele, em sua guerra contra o narcotráfico e a criminalidade. Os movimentos sociais anunciaram protestos pacíficos para rejeitar esse projeto prisional que reflete uma lógica policialesca e não ataca as raízes do problema.

Alinhados com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e os interesses de Washington, os últimos três governos equatorianos — Lenín Moreno (2017-2021); Guillermo Lasso (2021-2023); e Daniel Noboa (atual) — foram incapazes de conter a escalada de violência no país. Caracterizada por uma dupla dependência econômica, do dólar e dos recursos do petróleo, a difícil crise de segurança pública no Equador parece estar longe de terminar. Enquanto as raízes do subdesenvolvimento e da dependência estrutural não forem abordadas, é improvável que os índices de criminalidade diminuam. A alternativa proposta por grupos de direita se assemelha a uma estratégia do Plano Colômbia, envolvendo a mobilização de tropas, programas e recursos dos Estados Unidos. Enquanto isso, a esquerda equatoriana ainda carece de uma estratégia viável para enfrentar a complexa crise em curso.

A compreensão em rede desses grupos transnacionais pode ser o primeiro passo para desmantelar a atual situação de erosão democrática e, acima de tudo, construir uma segurança interna baseada em uma lógica sistêmica de combate à pobreza e na promoção e exercício dos direitos humanos.

 

 

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