OPINIÃO

A democracia é pura poesia — e muito mais

"As ameaças à democracia estão vivas e temos o dever de nos manter vigilantes, despertos"

Se existe uma pessoa ideal para conversar ao pé do ouvido sobre política esta se chama Ayres Brito. Ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal, ele tem o dom de elevar a política — não a partidária, a comezinha, a trivial, mas a que funda e aprofunda um país — a uma potência humanista, capaz de transformar e de guardar o que há de mais importante: a democracia. O ministro coloca tudo em seu lugar certo com palavras e ensinamentos.

Conversei mais uma vez com Ayres Brito e foi, como sempre, um momento de pura poesia. O que dizer de alguém capaz de cunhar frases assim: "Vou fazer uma comparação, para quem acredita em Deus. Deus não pode se varrer do mapa, porque se não leva o mapa junto. O Cosmos que ele instalou desaparece e volta o caos. A mesma coisa é a democracia. A democracia não pode ser varrida do mapa. Porque se ela vier a ser varrida do mapa, leva o mapa civilizatório junto. Nada de civilizado subsiste".

Nesta entrevista de quase duas horas por vídeoconferência, com algumas interrupções por motivos técnicos — que sem a substancial ajuda de Mariana Niederauer e Carlos Alexandre de Souza não chegaria às páginas da edição de hoje — falamos sobre o 8 de janeiro de 2023, o dia da barbárie, o dia em que vivemos a tristeza de ter as sedes dos Três Poderes da República invadidas, vandalizadas, destruídas. Qual ensinamento ficou de tudo isso? As instituições resistiram. Mas há riscos ainda de ataques à democracia?

Haverá atos para lembrarmos esse dia funesto, porque de fato não podemos varrer o que aconteceu para debaixo do tapete da história. As ameaças à democracia estão vivas e temos o dever de nos manter vigilantes, despertos.

Para Ayres Brito, o Brasil padece de "gravíssimos defeitos de fabricação colonial". Incluindo aí o preconceito que, por enquanto, ainda limita oportunidades para as mulheres ascenderem à mais alta corte do Judiciário, por exemplo.

"Para passar o Brasil a limpo, é preciso bater continência para a Constituição", diz Ayres. Simples assim. O respeito à nossa Lei Maior é o que nos protege e nos coloca no caminho para evoluir. Desejo que nosso 2024 seja maior e melhor. Que possamos colocar a democracia no topo dos valores, dos pedidos, das resoluções, sabendo que cada um de nós importa quando o alvo é protege-la contra o autoritarismo — esse não passará se estivermos juntos para proteger nosso país!

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