Ciência

Artigo: Todos ganham com uma ciência mais forte no Brasil

Não existe país desenvolvido sem ciência forte. Se a ciência brasileira continuar perdendo força, corre-se o risco de ter de importar cada vez mais soluções e tecnologias

A produção científica brasileira aumentou nove vezes desde 1996 — e o impacto dos trabalhos publicados na própria academia também cresceu no mesmo período. O que isso significa?

A ciência está em tudo. Se você se alimentou ou tomou um medicamento nas últimas 24 horas, a ciência está presente na sua vida. E estamos falando de todas as áreas do conhecimento: da pesquisa básica com moléculas que podem levar a novas drogas à compreensão da polinização pelas borboletas na produção agrícola ou às vacinas baseadas em mRNA.

Uma das maneiras de se medir a produção científica de um país é olhar para a quantidade de artigos científicos produzidos em suas instituições de pesquisa. São documentos escritos e avaliados por cientistas, que tornam públicos os resultados científicos.

A quantidade de artigos científicos com autores no Brasil cresceu. Nas últimas décadas, produzimos mais conhecimento para compreender o mundo, o Universo, as doenças, as relações sociais. Em 2022, ocupamos o 14º lugar no mundo em volume de produção científica. Recentemente, no entanto, houve um soluço inédito: o número de novos artigos científicos com autores brasileiros caiu 7,4% em 2022, em comparação ao ano anterior.

Ciências agrárias foi a área de conhecimento com maior redução: caiu 13,7%, de 2021 para 2022. Bastante preocupante em um país que depende tanto do agronegócio.

Esses dados estão na série de relatórios sobre a produção científica brasileira publicados pela Agência Bori com a Elsevier Pesquisa em 2023, com ampla repercussão na imprensa. As análises são importantes para informar o debate público para tomadas de decisão.

Mas o que acontece com esses milhares de trabalhos acadêmicos depois que são publicados? Os artigos científicos com autores no Brasil têm circulado bem e são usados por outros pesquisadores, em universidades ou em empresas. Isso é medido pela quantidade de vezes que um trabalho é mencionado em artigos subsequentes, o que é chamado de impacto por citações. Significa que o trabalho foi lido e usado, influenciando, de alguma maneira, o avanço subsequente do conhecimento ou sua aplicação.

Os artigos científicos com autores no Brasil e publicados em 1996 foram citados com frequência 30% inferior à média mundial. Em 2022, a frequência de citações subiu, mas ainda ficou 15% abaixo da média mundial. Houve progresso, mas ainda há muito a melhorar. A frequência de citações dos artigos de 2022 com autores na China ou Europa tem sido 16% e 14% acima da média mundial.

Aqueles com autores na Índia, desde 2019 superaram o impacto daqueles com autores no Brasil e estão, em 2022, apenas 2% abaixo da média mundial. Enquanto perdemos 7,4% na quantidade de novos artigos científicos em 2022, a Índia aumentou 19% sua produção científica e até ultrapassou o Reino Unido. Hoje, a Índia é o terceiro país do mundo com mais publicações, superado apenas pela China e pelos EUA.

Não existe país desenvolvido sem ciência forte. E, para isso, precisamos de investimento público e privado constante em pesquisa, na formação de novos cientistas, em seu emprego em empresas, universidades e institutos de pesquisa.

É fundamental que o Brasil reverta a tendência de queda observada em 2022, acelerando o aumento do impacto nacional e mundial da ciência criada no país.

O documento que, em 1947, levou a Assembleia Constituinte paulista a criar Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) alertava, usando citação do físico Ernest Rutherford: "A ciência está destinada a desempenhar um papel cada vez mais preponderante na produção industrial. E as nações que deixarem de entender essa lição hão, inevitavelmente, de ser relegadas à posição de nações escravas: cortadoras de lenha e carregadores de água para os povos mais esclarecidos".

Se a ciência brasileira continuar perdendo força, corre-se o risco de ter de importar cada vez mais soluções e tecnologias de países que, hoje, estão investindo e obtendo cada vez mais resultados em pesquisa científica e em tecnologia.

* Estêvão Gamba é cientometrista da Agência Bori

* Sabine Righetti é pesquisadora e professora do Labjor-Unicamp

* Carlos Henrique de Brito Cruz é vice-Presidente sênior de Redes de Pesquisa na Elsevier (Oxford, UK) 

 

 

 

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