A Terra está cada vez mais quente. A temperatura da superfície do nosso planeta aumentou 1,09°C desde a época pré-industrial — mais rápido do que em qualquer outro momento nos últimos 2 mil anos. Essa informação está no último relatório do Painel Intergovernamental das Alterações Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), órgão das Nações Unidas que fornece dados de base científica sobre alterações climáticas. Um grau a mais de temperatura pode parecer pouco, mas é suficiente para provocar alterações no funcionamento do sistema climático global.
Isso porque, diante desse aumento de temperatura, como um organismo vivo, nosso planeta busca o equilíbrio e reage ao excesso de calor em sua atmosfera, provocando oscilações no clima. Nessa conjuntura, temos observado aumentos nos extremos, com períodos muito mais chuvosos e mais secos, e mais quentes e mais frios. É diferente de quando essas situações são resultados de fenômenos naturais e observamos que as chuvas, a seca, o frio e o calor mais intensos acontecem e podem se repetir, mas sempre dentro de amplos intervalos de tempo, a cada 10, 20, 30, 40 anos ou mais.
O que estamos testemunhando agora são cenários como o dos últimos 18 anos na Amazônia. Tivemos uma seca em 2005, a maior dentro de um período de 100 anos, que poderia ser considerada um fenômeno natural. No entanto, as secas se repetiram de maneira intensa na região em 2010 e 2016. E, neste ano, mais uma seca extrema está em curso, com perspectiva de ser ainda mais severa que a de 2016. Essa frequência indica que o que está ocorrendo é reflexo do aquecimento da atmosfera terrestre, que, por sua vez, é consequência de ações humanas.
A ciência demonstrou que o aquecimento da atmosfera do planeta acontece devido ao aumento dos gases de efeito estufa. Esses gases já existiam na Terra e cumprem a importante função de reter o calor que emana da superfície para que ele não se disperse para o espaço. Os gases de efeito estufa mantêm a temperatura do planeta condizente com a vida. Sem eles, poderíamos ter um ambiente como o da Lua. No entanto, o aumento muito além do ideal desses gases causa problemas sérios.
As causas do aumento da presença dos gases de efeito estufa na atmosfera tiveram início com o desenvolvimento industrial, com base em fontes de energia que geram muito calor — carvão e petróleo. Já em 1898, estudos mostraram que a queima de madeira, carvão ou qualquer outro material libera dióxido de carbono (CO2), um dos gases de efeito estufa. Na época, os cientistas alertavam para o perigo da emissão e concentração de CO2 na atmosfera e afirmavam que, se isso continuasse, no futuro a temperatura da Terra poderia aumentar entre 4ºC e 5º C.
Já estamos com o pé nesse futuro. Hoje, a ciência é capaz de fazer projeções com base em modelos climáticos e, de fato, se ignorarmos o aquecimento global e não tomarmos qualquer medida, em 2100 o planeta pode ficar ainda mais quente, com mais um aumento entre 4ªC e 5ªC em sua temperatura. E isso traria consequências devastadoras, com eventos climáticos extremos que teriam impacto na produção de alimentos, na segurança hídrica, na conservação da biodiversidade, na qualidade de vida nas cidades, na produção de energia, entre outros aspectos essenciais à sobrevivência da espécie humana.
No Acordo de Paris, em 2015, o pacto foi limitar o aumento da temperatura média do planeta a 1,5°C, em relação ao período pré-industrial. Para isso, precisamos alcançar emissão zero de gases de efeito estufa até 2050. O tema é uma pauta global, e líderes mundiais participam da discussão em fóruns como a Conferência das Partes (COP), órgão supremo da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima.
Para alcançar a meta de emissão zero de gases de efeito estufa, sabemos o que fazer. Um dos pontos principais é a mudança da matriz energética. É uma transformação que exige um alto investimento, e a transição tem sido lenta, inclusive em países desenvolvidos, como os EUA, que têm uma matriz energética fundamentada em carvão e combustíveis fósseis.
Apesar do desafio, eu acredito ser possível cumprir a meta de emissão zero até 2050. Os gases de efeito estufa que foram colocados na atmosfera do planeta ainda ficarão por séculos, mas, ao parar com essas emissões, conseguiremos que o clima se mantenha em um patamar e se torne mais estável. Portanto, é urgente passarmos da discussão para a ação efetiva. É preciso manter o diálogo e intensificar a cooperação internacional. Não se trata de uma escolha, mas do dever de garantir condições de vida no planeta para as atuais e futuras gerações.
* Tercio Ambrizzi é professor titular do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) e diretor do Instituto de Energia e Ambiente (IEE), ambos da Universidade de São Paulo (USP)
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