*Ministra da Igualdade Racial e Secretária-executiva do Ministério da Igualdade Racial, respectivamente
A palavra-chave é retomada. Ou melhor, recomeço. Em novembro, perdemos a presença física do intelectual quilombola Nêgo Bispo. Ele falava que existia "Começo, meio e começo de novo", apresentando, por meio de uma reflexão organizada pela experiência quilombola, a defesa da terra, da natureza e das lutas, como a ciclicidade e as confluências são geradoras do novo, mas este segue, tal qual Sankofa, ligado a um passado que nos ensina o caminho.
O dezembro analítico encerra o primeiro ano do Ministério da Igualdade Racial e o balanço para o novo começo se impõe. Como o pássaro mítico da cultura yorubá, trilhamos os passos projetados pelas gestões da saudosa Luíza, Nilma, Matilde, Edson, Eloy e Martvs, para buscar o que tentaram destruir e sedimentar assim o recomeço. A necessidade de protegermos o legado de quem veio antes de nós e respondermos às necessidades impostas pelo hoje nos fez não parar! Em bom pretuguês, compartilhamos semanalmente os "corres" dessa nova gestão. E foram muitos!
A gestão e articulação nacional desta agenda, de modo transversal com mais de 20 ministérios, que atualizaram seus programas na perspectiva do enfrentamento às desigualdades étnico-raciais e pela equidade, poderiam resumir o desempenho deste primeiro ano do Ministério da Igualdade Racial, mas seria um cálculo subdimensionado.
Com justo orgulho, podemos dizer que o maior pacote de medidas pela igualdade racial realizado em apenas um ano está em vigor. Com programas focados no fortalecimento econômico, estímulo educacional, titulação de terras e acesso aos espaços de poder para pessoas negras, quilombolas, de comunidades tradicionais, povos de terreiro e povos ciganos. De forma direta, falamos de editais para bolsas de doutorado e pós-doutorado, intercâmbio com países da América Latina e África, retomada do Japer (Programa de Cooperação para o enfrentamento à Discriminação Racial entre o Brasil e os Estados Unidos da América), lançamento de programas como o Aquilomba Brasil, Programa Federal de Ações Afirmativas e ações para geração de emprego e renda com inúmeras organizações, entre outras medidas, integram esse pacote.
O trabalho do ministério reposicionou a agenda pela igualdade racial no plano nacional e global. No Brasil, realizamos política com quem mais entende: o povo. Com programas construídos por meio de Caravanas por todo o território nacional, bem como em campanhas para que a população indicasse as prioridades para o Plano Plurianual, a igualdade racial, hoje, encontra-se entre as prioridades para a agenda programática para o desenvolvimento do Brasil. Agora, mais estáveis, descentralizadas e visíveis, tanto na montagem das estratégias do centro de governo, nas ações específicas dos órgãos e suas rubricas do Plano Plurianual, quanto no pronunciamento à nação. A igualdade racial tratada como deve ser: compromisso de governo e política de Estado.
O Ministério da Igualdade Racial também influenciou a retomada do protagonismo brasileiro internacionalmente, por meio de acordos com os Estados Unidos, Colômbia e Espanha para a promoção de direitos afrodescendentes, combate ao racismo e à xenofobia. Reativou as estratégicas relações com o Mercosul e mobilizou os debates que viabilizaram a adoção voluntária do Brasil ao 18° Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS 18), centrado na igualdade racial, para ocupar essa lacuna na formulação e construção de planos sustentáveis globalmente.
Os resultados do ano revelam o amadurecimento do país na compreensão de que enfrentar o racismo é combater as raízes das desigualdades e da exclusão social. Em grande medida, o ODS 18 ratifica os marcos da Declaração de Durban, resultado da Conferência Mundial Contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerâncias Correlatas, realizada em 2001, na África do Sul.
Marco incontestável da luta antirracista global, Durban projetou a institucionalização da pauta no Brasil, com a criação da Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, e apresentou os conceitos das cotas raciais e ações afirmativas, hoje consolidados instrumentos de reequilíbrio para realidades profundas e estruturalmente desiguais.
A missão do MIR também ratifica Durban em seus macroeixos do Direito à Vida e Dignidade, Memória e Reparação, Educação e Inclusão e Direito à Terra, expressos em medidas que sintetizam a vida com cidadania. Ainda há muito por fazer, e sabemos que os desafios para dignificar a vida da maioria da população são de grandes proporções. Contudo, o papel de liderança do Brasil também é de magnitude e o trajeto firme de 2023 nos conduz à expansão dos nossos horizontes.
Para 2024, queremos avançar para que a promoção da igualdade seja prioridade na pauta econômica e geração de emprego, como o é na agenda social, uma vez que não cabe mais negligenciar o custo econômico da discriminação e da exclusão racial, barreiras diretas ao desenvolvimento sustentável. A justiça climática é parte dessa discussão, que também ativaremos com máximo vigor.
São pautas convergentes com as prioridades do nosso ministério e as emergências globais. Encerramos o ano com o orgulho do dever em pleno cumprimento e projetamos um novo ciclo de trabalho de ainda mais musculatura para construir políticas públicas que modifiquem positivamente as trajetórias negras. O Ministério da Igualdade Racial é a matriz do futuro e, lá, as diferenças jamais configuram desigualdades.
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