O presidente da Argentina, Javier Milei, começa o governo dando um péssimo exemplo à sociedade: a revogação de uma lei que proíbe o nepotismo. Tudo para saldar uma dívida de gratidão com a irmã, Karina Milei, premiada com a Secretaria-Geral da Presidência por ter sido uma das mentoras da campanha do ultralibertário. A medida, imoral, vai na contramão de um líder que se moldou com a proposta (utópica, para muitos especialistas) de promover uma ruptura com a casta política. O nepotismo tem sido usado, a torto e a direito, pela classe política, inclusive no Brasil. Muitos são os engravatados que veem a carreira pública como a oportunidade de beneficiar os próprios familiares. Aliás, a política deveria fechar as portas para o carreirismo. Deveria estar calcada no bem-estar social, no desenvolvimento e no progresso da sociedade, no combate à miséria.
Os argentinos esperam que Milei seja uma tábua de salvação para as mazelas econômicas de uma nação afundada em dívidas, em inflação e em pobreza. Mas o ex-roqueiro de cabelos de estética rupturista e caretas bizarras não pode fazer mágica, nem executar seus planos de governo se não tiver governabilidade. Milei está praticamente sozinho na tarefa de tirar a Argentina de um atoleiro. Conta com o apoio de apenas sete dos 72 senadores e 39 dos 257 deputados. Os seguidores do peronismo, corrente política atacada de modo intestinal por ele durante a campanha e o discurso de posse, serão maioria absoluta no Congresso e oposição feroz aos projetos de lei mais polêmicos.
Assim como um ex-presidente brasileiro, Milei se traveste de um messianismo absurdo. Escolhe o comunismo como inimigo estratégico, mas se esquece de dizer aos seus séquitos que esse modelo econômico ruiu com a Cortina de Ferro. Adota passagens bíblicas, meio que para justificar sua retórica, e ignora o caráter laico do Estado, que deveria ser premissa sagrada. Entusiasta do armamentismo, parece não enxergar o fato de que, quanto mais armas em circulação, maiores as possibilidades de elas caírem nas mãos de criminosos.
O inimigo da casta política que propõe acabar com o Banco Central, dolarizar a economia, legalizar a venda de órgãos humanos, entre outras presepadas, precisa abandonar suas propostas mais extremas e o discurso virulento, se quiser realmente governar. Caso contrário, entrará para a história como o presidente que lançou a Argentina no precipício e ampliou ainda mais o fosso da pobreza. Começar com o apego à ética e à moralidade na política seria um bom exemplo.
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