José - Pastor e Professor da Faculdade de Economia da Universidade de São Paulo e membro da Academia Paulista de Letras
No dia 29 de outubro passado, o Brasil perdeu um verdadeiro missionário da cultura — Danilo Santos de Miranda, diretor do Sesc São Paulo desde 1984. Na sua longa trajetória, Danilo trabalhou dia e noite para multiplicar as oportunidades de formação cultural de milhões de brasileiros. Acertadamente, dizia que a educação escolar é fundamental, mas insuficiente para formar as pessoas. É essencial expô-las a teatro, cinema, fotografia, samba, ópera, dança, folclore, verso, prosa, arquitetura, artes plásticas, praça de esportes, refeitório barato, colônia de férias etc. Tudo é cultura, insistia, até consulta ao dentista, atenção às gestantes, cuidados ao bebê, aulas de culinária, costura e artesanato e muitas outras atividades que ajudam as pessoas a viver melhor e subir na vida.
Sem conhecer os detalhes, Danilo era um vigoroso implementador do novo conceito de capital humano, criado pelo Banco Mundial em 2018, que vai além da mera escolarização para incluir o bem-estar físico e mental da população (World Bank, The human capital project, Washington, 2019).
Danilo fez escola. A rede do Sesc de todo o Brasil vem utilizando esse conceito com desenvoltura, e em complemento do trabalho de formação profissional realizado pelas escolas do Senac na área do comércio, serviços e turismo. Assim também ocorre com o Sesi e o Senai na área industrial. Essa tem sido a valiosa contribuição das entidades do Sistema S ao trazer reflexão, provocação, pensamento, discussão, saúde física, higiene mental e cuidado às crianças.
Com base nisso, dizia Danilo, só assim, no médio e longo prazos, podemos chegar a uma população mais bem preparada para o trabalho e para a vida — e a um país melhor. Mas, com a mesma fé com que trabalhava, Danilo lamentava a incompreensão de vários governos que pretendem desviar os recursos da formação de capital humano para outras atividades, como foi a tentativa recente de tirar 5% do orçamento da formação profissional do Senac para aplicar no turismo.
Não tem cabimento perseguir as instituições de formação profissional nestes dias em que a escassez de pessoal qualificado é aguda e crítica. Pesquisa recente da Manpower indicou que 81% das empresas brasileiras têm algum problema nesse campo. Nas estimativas do Senai, o Brasil precisa qualificar 10,5 milhões de trabalhadores industriais nos próximos quatro anos.
O mesmo ocorre na área do comércio e serviços. Pesquisas do Senac mostram uma falta de mão de obra qualificada para hospedagem, gastronomia, logística, comunicação, saúde, segurança e até educação, onde está havendo um verdadeiro apagão de professores em várias áreas. Os estudos da Brasscom indicam haver cerca de 500 mil vagas não preenchidas em tecnologia da informação. No agro, a rápida elevação dos salários indica uma grave escassez de pessoal qualificado.
E assim são os números para quase todos os setores da economia brasileira. E se o país voltar a crescer nos próximos anos (como se espera), haverá uma carência de mão de obra qualificada ainda mais severa que comprometerá a expansão das empresas e dos empregos.
Ao reverenciar a extraordinária contribuição de Danilo Santos de Miranda à frente do Sesc São Paulo, temos de lembrar que o Brasil precisa ampliar ainda mais o seu esforço no campo da formação cultural e da qualificação profissional — e não diminuir.