Consciência negra

Artigo: Racismo real no mundo virtual

Estudo do Pnud, Faculdade Baiana de Direito e Portal Jus Brasil faz levantamento de decisões judiciais sobre as diferentes expressões de racismo

Promulgada a Constituição de 1988, o então deputado constituinte, jornalista e advogado Carlos Alberto Caó de Oliveira aprovou a Lei nº 7.716 (Lei Caó), dispondo sobre os crime de racismo e estabelecendo punições desde multa até privação de liberdade aos agressores dos negros. Muito eventualmente, teve-se notícia de alguém que tenha passado alguns dias preso por incorrer no crime de racismo. A compreensão do Judiciário de que ofensa pessoal não passava de injúria racial, portanto xingar, ofender e humilhar, não configurava racismo, pois o autor não estaria ofendendo um povo. Assim, a Lei Caó ficou na estante, sem ser aplicada.

Em 2021, o Supremo Tribunal Federal, diante do aumento de casos — alguns até estimulados por ocupantes de altos cargos no poder público —, entendeu que injúria racial é crime de racismo, inafiançável e imprescritível, como estabelece a Constituição Cidadã, com sanções previstas no Código Penal. E como as instâncias do Judiciário julgam os crimes raciais em todas suas formas de manifestação por meios virtuais?

Para responder à indagação, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), a Faculdade Baiana de Direito e o portal Jus Brasil analisaram 107 acórdãos (decisões colegiadas dos tribunais), entre julho de 2010 e outubro de 2022. O estudo foi levado, há poucos dias, ao Ministério da Igualdade Racial.

Para a diretora de Ações Governamentais do ministério, Ana Míria Carinhanha, o levantamento é insumo para entender as categorias de ofensas, os tipos de ameaças e também para saber como o Poder Judiciário tem lidado com as denúncias de racismo e injúria racial, segundo informou a Agência Brasil. O levantamento mostrou que as mulheres somam quase 60% das vítimas de racismo e de injúria racial, enquanto os homens chegam a 18,29% e outros, cujo gênero não foi identificado, correspondem a 23,17%. Embora a maioria dos agressores sejam homens (55,56%), surpreendentemente, as mulheres chegam a 40,74%. Faltou no estudo um recorte de raça/cor dos agressores.

No final do mês passado, as ministras Anielle Franco (Igualdade Racial) e Margareth Menezes (Cultura) e o ministro Sílvio Almeida (Direitos Humanos e Cidadania) reuniram-se para acertar as atividades que serão realizadas neste mês, consagrado à Consciência Negra, festejada no próximo dia 20, em memória ao líder Zumbi dos Palmares, figura ícone da resistência na luta contra a escravidão. O governo promete e mantém guardado um pacote de medidas favorável ao povo negro. Nas redes sociais do Executivo, não faltam críticas nem cobranças do tipo: "Quando haverá pacote para os brancos?".

O racismo e a depreciação de pessoas pretas e pardas são comuns no Brasil desde o século 16, quando os primeiros negros foram sequestrados em países africanos e submetidos ao regime escravista no Brasil e a todos os tipos de torturas. Avanços na legislação tentaram eliminar ou cicatrizar a profunda chaga social criada pelos colonizadores e pela escravidão. Os resultados foram pífios. Ainda falta letramento à sociedade para que haja igualdade étnico-racial, além de equidade de gênero, neste país.

 


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