RIO DE JANEIRO

Visão do Correio: É preciso conter o crime organizado com inteligência

O Brasil tem de encarar a questão da segurança pública como prioridade, assim como a educação e a saúde, sob pena de termos cidadãos educados e saudáveis, mas reféns da violência

Os atos praticados na Zona Oeste do Rio de Janeiro são uma afronta não só ao governo do estado como também a todo o Brasil. Há anos, o país assiste, passivamente, ao aumento da violência no lugar que já abrigou a sede do governo brasileiro e que é o cartão-postal do Brasil no mundo, seja por suas belezas naturais, por seus carnavais que se candidatam à maior festa do mundo ou pela Garota de Ipanema, a bela canção de Antônio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes, que ganhou mais de 500 versões em todo o mundo. Basta. Não é mais possível que, depois do que ocorreu segunda-feira, se busque as mesmas soluções que foram ineficientes até agora. O Brasil precisa encarar a questão da segurança pública como prioridade, assim como a educação e a saúde, sob pena de termos cidadãos educados e saudáveis, mas reféns da violência.

No Rio de Janeiro, apesar da intervenção federal entre 2018 e 2019, exatamente para combater o crime organizado, não se chegou a uma proposta para equacionar o problema das milícias, que surgiram como grupos paramilitares criados em comunidades, com o argumento de oferecer segurança e combater o tráfico de drogas. O que pareceu ser um "remédio", aceito passivamente pelas autoridades e por moradores, sendo que estes estão sempre acuados e no meio do tiroteio. Um levantamento feito pelo Grupo de Estudos de Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense (UFF), as milícias formam o maior grupo criminoso do estado, com um aumento de 387% nas áreas sob domínio de grupos paramilitares, entre 2006 e 2021.

Hoje, o domínio desses grupos ilegais corresponde a 256km², o que equivale, praticamente, à metade do território do crime organizado na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, que chega a 510km². Nada menos do que 4,4 milhões de cidadãos vivem em áreas controladas por milicianos ou traficantes no Rio de Janeiro. Na prática, operando quase que "livremente", milicianos e traficantes estão juntos em muitos locais, formando o que é chamado de "narcomilícias".

Com a omissão do poder constituído, que muitas vezes é integrado por criminosos, esses bandidos agem quase que impunemente, e apenas reagem de forma terrorista — afronta ao estado e temor nas pessoas — quando veem seus interesses contrariados. A reação à morte de Matheus da Silva Rezende, o Faustão, bandido acusado de mais de 20 homicídios, levou à queima de 35 ônibus e um trem, causando um prejuízo de mais de R$ 35 milhões, deixando milhares de trabalhadores sem transporte, alunos sem aula e obrigando o comércio a fechar as portas.

O governador do Rio de Janeiro, Claudio Castro, anunciou a prisão de 12 pessoas que teriam colocado fogo nos veículos. Seis delas foram soltas. É uma resposta pequena e insignificante do poder público estadual. De ataque em ataque, o Rio vai se transformando em um campo de guerra e os governos vão se esforçando em adotar medidas que não atacam de frente o problema do crime organizado. No meio político, volta-se a discutir a criação do Ministério da Segurança Pública, como se a existência de uma estrutura isolada fosse suficiente para resolver o problema da violência.

Mais do que burocracias é preciso modernizar a legislação criminal para endurecer as penas, modernizar e rever a estrutura carcerária brasileira, que com raras e honrosas exceções ressocializa detentos, e combater o fluxo financeiro dessas organizações, para sufocá-las e ter uma forma de usar esse dinheiro da atividade criminosa na reparação de prejuízos causados pelos atos terroristas que promovem. É preciso mais do que discursos e estruturas burocráticas, é preciso inteligência para tornar efetivas as ações contra o crime organizado.

 

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