Uma das expressões que se tornaram comuns é: "O golpe está aí, cai quem quer". Quando algum ataque criminoso ocorre, a sociedade parece estar condicionada a lamentar o ocorrido, mas, ainda que de forma inconsciente, culpabiliza a vítima. O golpe está aí, mas não cai quem quer. Cai quem se permite, de alguma forma, ser acessado e envolvido pelos autores, mas é preconceituoso e leviano afirmar que essa permissão se dá pela livre espontaneidade.
Ainda que involuntariamente, adotei um julgamento sobre pessoas que se deixam levar pelas artimanhas de golpistas virtuais. Como podem ser tão ingênuas? Porém, talvez até por me achar esperto demais, eu próprio caí numa dessas. Fui atraído pela notificação de que uma compra indevida havia sido feita no meu cartão e, como já ocorreu em outro episódio, contestei a transação. Acreditando estar em contato com o banco digital do qual sou cliente, confirmei meus dados e entrei no aplicativo para executar a medida protetiva de segurança. Na boa-fé de que os mecanismos de segurança da instituição financeira bloqueariam uma transação suspeita, permiti que os golpistas saqueassem em torno de R$ 18 mil entre empréstimo e crédito do cartão. O golpe estava lá e eu caí, mas não foi porque quis.
É impressionante como, nesse processo todo, a nossa mente nos trai a ponto de não observar os detalhes e perceber que aquilo está estranho. Talvez porque, de alguma forma, hoje nós estejamos programados para efetuar ações automáticas que nos coloca uma barreira no raciocínio. Acesse, digite sua senha, clique aqui, envie, confirme. Os comandos são sempre tão mecânicos e imperativos que a instantaneidade nos assalta de forma que não refletimos mais sobre o porquê de estarmos seguindo tantas instruções imediatas. Ninguém lê os termos; apenas os aceita. Estou ciente e quero continuar.
Os estelionatários dominam essas fragilidades do sistema. Eles entram no nosso intelecto, derrubando as defesas, porque sabem que estamos acostumados a agir no modo repetitivo. Como cães, estamos adestrados a dar a patinha e correr em busca da bolinha que a atualidade nos instrui diariamente. Nós confiamos. Infelizmente, no meu caso, a instituição financeira envolvida não dispõe de uma segurança eficaz. O que traz aqui um segundo ponto a se observar.
O banco envolvido alega que utiliza o reconhecimento facial para impedir fraudes. Mas não é o suficiente, quando, por exemplo, o cliente com o rosto registrado está sob ameaça, talvez de uma arma apontada. O correto seria, ao detectar que uma movimentação financeira suspeita, incomum para a rotina do correntista, está sendo feita, que se bloqueie o processo para que haja uma confirmação de legitimidade mais robusta. Outro banco do qual sou cliente impõe um limite para transferências e compras on-line. É o mínimo que se espera.
Por fim, deixo os alertas. Não confie plenamente na sua capacidade intelectual para se achar imune aos golpistas: qualquer um, por mais astuto que seja, pode ser vítima. Não entregue a sua segurança totalmente nas mãos de uma instituição financeira, em especial as digitais: mais até que a sua inteligência, elas são falhas e omissas. E, acima de tudo, tentemos sair desse modo automático que nos oprime e nos vulnerabiliza.
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