Carlos Motta
Daniella Raigorodsky
André Camargo
É comum recebermos esse questionamento aparentemente simples, mas desafiador, em especial diante dos inevitáveis custos e resistências que tal jornada, normalmente, proporciona. Essa indagação é especialmente mais relevante neste ano repleto de novidades (e desafios) sobre o tema "governança corporativa". Escândalos corporativos que impactam em todo o sistema de responsabilidade de acionistas, administradores e até gatekeepers; novas regras trazidas para o Formulário de Referência das companhias abertas brasileiras; diversos questionamentos colocados sobre a Lei das Estatais (Lei nº 13.303/2016).
Novas recomendações trazidas pela recém lançada 6ª edição do Código de Melhores Práticas do IBGC e pelos princípios globais revisados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE); questões sobre melhorias em diversidade nos níveis da administração, entre inúmeras outras discussões sobre essa temática. Todas as organizações, independentemente do seu porte, tipo societário, estrutura de capital ou ramo de atividade, públicas ou privadas, estão sendo atualmente instadas a se debruçarem a esse respeito.
Um receio muito comum quando se fala em governança corporativa é o de se criar indesejáveis custos de transação e procedimentos que possam burocratizar e onerar exageradamente os processos decisórios de uma organização. É inegável que embarcar nessa trajetória demanda investimentos não insignificantes e precisaremos sempre mapear todos os custos e resistências que existirão, muitas vezes perceptíveis no curto prazo, em uma visão profissional e realista.
Estudos acadêmicos e evidências empíricas indicam que investir em governança corporativa e melhorar a diversidade em todos os níveis de uma organização, no entanto, proporcionam uma série de vantagens, algumas aferíveis de imediato, outras a serem apropriadas no longo prazo. Podemos listar ao menos 15 ganhos essenciais (de cunho financeiro, gerencial e reputacional) que temos percebido em diversos projetos dos quais temos participado:
Redução de custo de capital, em especial para financiadores cada vez mais criteriosos e que incluem, em suas análises, uma avaliação mais qualitativa do tomador do recurso;
Aumento da quantidade e qualidade das fontes de financiamento (em aumentos de capital ou emissões de dívida), possibilitando à organização mais e melhores opções no mercado nacional e internacional;
Melhoria em indicadores de desempenho e avaliações realizadas por agências de ratings e obtenção de certificações/reconhecimentos de mercado; mitigação do risco de responsabilização pessoal de sócios, administradores e demais lideranças, que passarão a atuar mais alinhados às diretrizes da organização e em melhor cumprimento de seus deveres legais e estatutários/contratuais;
No caso de companhias abertas, melhoria do nível dos acionistas (base acionária mais engajada) e aumento do número de potenciais investidores interessados no negócio;
Diferenciação de competidores, tornando-se benchmarks para investidores e mercado;
Redução do risco de ocorrência de falhas humanas ou operacionais e de fraudes, uma vez que o sistema de gestão de riscos, controles internos e compliance funcionará de forma mais eficaz, rápida, homogênea e preventiva, atuando só excepcionalmente de maneira remediativa;
Atração e retenção de talentos, proporcionando carreiras mais longevas e prósperas para melhores e mais alinhadas ao propósito institucional;
Aprimoramento dos processos decisórios, que passarão a contar com discussões colegiadas mais técnicas e profundas, baseadas em informações e dados atualizados, amplos e muito mais precisos. Consequentemente, as lideranças terão à disposição um maior número de alternativas para decidir;
Mais clareza na separação de funções e papéis de todos, auxiliando em uma melhor e mais eficiente gestão de pessoas (e de resultados);
Melhores mecanismos de avaliação (positiva ou negativa) e de recompensa, valorizando o princípio da meritocracia real;
Maior estabilização e institucionalização de processos internos e relacionamentos externos (evitando o indesejável "capitalismo de laços" e demais situações de nepotismo, privilégios ou outras formas de injustiça);
Melhoria no clima organizacional, favorecendo o chamado "ambiente psicologicamente saudável", que passará a ser orientado por princípios da integridade, transparência, equidade, responsabilização (accountability) e sustentabilidade;
Melhor gestão de impasses, conflitos e da própria litigiosidade interna e externa à qual a organização está ou possa estar sujeita. Se a ideia é que estejamos mais em sintonia com os stakeholders (partes interessadas e estratégicas), a governança das formas de solução de controvérsias é fundamental na construção desse relacionamento mais saudável; e maior desenvolvimento econômico para o entorno da organização, bem como para o setor e região do país em que a organização atua ou exerce influência.
É claro que todo o projeto de governança corporativa precisa ser muito bem estruturado, iniciando por uma customizada assessment formal e material para se aferir o diagnóstico do estágio desse sistema de relacionamentos de longo prazo. Destacados acima os pontos positivos a serem fortificados e os desafios a serem enfrentados, entretanto, um plano de ação realista, faseado e incremental deve ser elaborado para cada contexto analisado.
O investimento correto e preciso em governança corporativa certamente diferenciará a organização neste momento tão desafiador e competitivo. E esse investimento não precisa, em um primeiro momento, ser massivo, completo ou dispendioso. Cada organização pode melhorar sua governança aos poucos, de forma faseada e que não pese em seu orçamento. O importante é começar para não ficar para trás ou aprimorar continuamente o que se tem, para sempre se destacar entre seus pares e concorrentes.
Carlos Motta, Daniella Raigorodsky e André Camargo, especialistas da prática de relações societárias e governança corporativa
Saiba Mais
Gostou da matéria? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:
Dê a sua opinião! O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores pelo e-mail sredat.df@dabr.com.br