Editorial

Visão do Correio: A força da cultura

Depois de quatro anos de destruição, já é possível ver os resultados da retomada de políticas que incentivam a produção artística

A reconstrução do setor cultural brasileiro é alvissareira. Depois de quatro anos de destruição, já é possível ver os resultados da retomada de políticas que incentivam a produção artística. O Brasil, com toda a sua diversidade e a sua riqueza cultural, não pode permitir, novamente, que posições ideológicas cerceiem as manifestações que fazem do país uma referência no mundo. A cultura é fundamental para o desenvolvimento e a identidade de uma nação. Não pode se render aos que temem a arte como expressão de opinião e de criatividade.

O primeiro grande passo para esse movimento foi a recriação do Ministério da Cultura. Reduzir a pasta a uma mera secretaria do Ministério do Turismo, como ocorreu na administração passada, foi um retrocesso. O resultado de tamanho descaso foi a paralisia de instituições fundamentais para a disseminação do conhecimento e a preservação do patrimônio histórico e da identidade nacional. Serão necessários anos de trabalho para recuperar o tempo perdido e a descontinuidade de ações estratégicas.

A estupenda Biblioteca Nacional estava praticamente fechada. A Fundação Palmares foi completamente depredada. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) deixou de tocar projetos vitais para recuperar acervos e manter viva a história do país. Essas instituições, felizmente, como tantas outras, foram colocadas novamente de pé. Mas, como bem ressalta a ministra da Cultura, Margareth Menezes, ainda há muito por ser feito. O setor está longe da recuperação total.

É importante ressaltar que, além de atitudes deliberadas para minar o segmento cultural, com perseguições implacáveis aos artistas, houve, nos últimos anos, uma pandemia. No período de enfrentamento ao novo coronavírus, a produção de artes quase parou. O pouco que se fez foi graças à tecnologia, que permitiu, por exemplo, as lives que deram um ânimo importantíssimo à população. No ano passado, já com o pico da crise sanitária superado, mas ainda sob um ambiente hostil, o setor cultural respondeu por 3,11% do Produto Interno Bruto (PIB). Milhares de empregos foram resgatados e renda, distribuída.

Não há dúvidas de que, com o devido apoio, a cultura brasileira será peça estratégica para ajudar na retomada da economia. Teatro, cinema, shows musicais, televisão, streamings, festas populares, enfim, todos os tipos de manifestações artísticas têm um enorme potencial para absorver mão de obra e gerar riqueza. É fundamental, porém, que as políticas em vigor promovam uma ampla desconcentração de projetos. Não pode mais Rio de Janeiro e São Paulo concentrarem o grosso das verbas de incentivos, enquanto as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste ficam com o que sobrar.

Um dos instrumentos mais poderosos para essa desconcentração é a Lei Roaunet, que permite às empresas que patrocinam projetos culturais abater parte das despesas no Imposto de Renda. Essa legislação foi amplamente atacada por inimigos da cultura, mas é uma ferramenta espetacular para garantir que a população tenha acesso a espetáculos que, sem apoio, dificilmente, sairiam no papel. As companhias precisam olhar mais para o Brasil diverso ao alocarem os patrocínios.

Para medir como há interesse por cultura em todos os cantos do país, basta ver o resultado da Lei Paulo Gustavo, que destinará R$ 3,8 bilhões a projetos na área. Noventa e oito por cento dos municípios brasileiros se inscreveram para receber os recursos e levar arte aos cidadãos. Esse é o caminho para a inclusão. Todos os brasileiros, dos cantos mais remotos do país às periferias empobrecidas, têm o direito do acesso à cultura, que transforma vidas, resgata a autoestima, ecoa o sentimento de uma sociedade plural e preserva a identidade nacional.

Pobre do país em que as manifestações culturais são vítimas da censura, do preconceito, da visão distorcida de governos autoritários. O Brasil flertou com o atraso, mas a resistência dos artistas e de todos aqueles comprometidos com a arte venceu. Os ventos que agora sopram são de liberdade, respeito, tolerância, diversidade e criatividade, como deve ser sempre.

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