INFÂNCIA

Artigo: Paternidade responsável é direito de todas as crianças

No Brasil, mais de 5,5 milhões de crianças não têm o nome do pai na certidão de nascimento, e esse dado é ainda de 2012, segundo levantamento do Ministério da Educação sobre o número de alunos matriculados na rede de ensino que só tinha o nome da mãe no documento

Charles Bicca,  presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Criança Adolescente e Juventude da OAB/DF 

Neste mês de agosto estamos comemorando o Dia Nacional de Conscientização sobre a Paternidade Responsável pela primeira vez no Brasil. A recente Lei nº 14623/23, instituiu o dia 14 de agosto para a conscientização de todos aqueles que não cumprem suas obrigações legais de assistir, criar e educar os filhos menores, e serve para que sejam anualmente, após o Dia dos Pais, lembrados dos seus deveres parentais.

O Dia dos Pais costuma ser celebrado com muita alegria, abraços, bilhetes e carinho, mas é uma alegria que infelizmente não chega a todos os lares. No Brasil, mais de 5,5 milhões de crianças não têm o nome do pai na certidão de nascimento, e esses números são ainda de 2012, quando o Conselho Nacional de Justiça solicitou ao Ministério da Educação o número de crianças matriculadas na rede de ensino que só possuíam o nome da mãe no documento. Assim, podemos imaginar qual não seria esse número hoje, após mais de uma década. E as crianças que tão somente possuem o nome na certidão, mas nunca tiveram um pai na vida real?

No Judiciário crescem o número de ações de reparação de danos causados pelo que denominamos “abandono afetivo” com fundamento no artigo 227 da Constituição Federal, que garante o direito de convivência, bem como, no artigo 229 da mesma CF/88, que impõe aos genitores o dever de assistir, criar e educar os filhos menores. E no legislativo, projetos de lei avançam no sentido de punir aqueles que abandonam os seus filhos, o que pode ser considerado violação grave ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, que submete todo o ordenamento jurídico brasileiro.

O que se nota, é que foi preciso estabelecer uma data para que muitos reflitam sobre a dor de uma criança que espera por um sentimento, ainda que mínimo, de atenção e amor. Diversos estudos científicos já comprovaram a possibilidade de sequelas do abandono, que inclusive, se não forem devidamente tratadas, podem perseguir o adulto pelo resto da vida. Abandonar é ato ilícito que destrói milhares de projetos de vida e causa os mais diversos problemas sociais. É preciso colocar um fim a uma sociedade de filhos órfãos de pais vivos!

No entanto, não basta tão somente lembrar aqueles que não cumprem tal dever legal, mas fazer campanhas e esclarecer sobre a importância da paternidade consciente, dos seus benefícios para os filhos, para a sociedade, e até para os próprios pais. Estudos científicos em todo o mundo comprovam que a negligência emocional na infância pode influenciar inclusive na probabilidade de doenças na vida adulta, e por outro lado, uma relação saudável e a forte conexão entre pais e filhos é uma das mais potentes formas de intervenção na saúde mental do ser humano.

Precisamos refletir sobre uma nova parentalidade que faça sentido no mundo atual, aonde alguns modelos que serviram aos nossos antepassados sejam reavaliados de acordo com as intenções de cada família. É mais sobre desaprender sobre aquilo que não promove uma relação saudável entre pais e filhos do que sobre aprender. Os filhos não precisam trazer orgulho para serem amados e nem fazer nada de
especial para que recebam a nossa aprovação. Devem ser amados tão somente por existir. Que se libertem das nossas ideias, projetos pessoais e expectativas, e possam seguir em paz os seus destinos.

Ao contrário dos nossos antepassados, que educaram os filhos por meio de crenças culturais transmitidas ao longo de séculos, hoje temos à disposição um acervo imenso de livros, pesquisas cientificas, cursos e profissionais que podem nos auxiliar na dificílima tarefa de educar os nossos filhos. É necessário construir um vínculo seguro e forte entre pais e filhos, e esquecer todas as práticas que não estiverem a promover uma relação saudável.

Em muitos casos, é possível que o desfazimento da relação do casal tenha influenciado no afastamento do genitor, mas é preciso compreender que o pai pode separar da mãe, e vice-versa, e ninguém tem dúvida disso, mas dos filhos, jamais. E assim, que nesta data, cada pai que por algum motivo se afastou do filho, reflita sobre a importância da paternidade responsável e volte a se envolver na vida do seu filho, pois afinal de contas, ele só será criança uma vez, o tempo passa rápido, e o primeiro passo nessa direção pode ser dado ainda hoje.


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