NULL
economia

Artigo: A expansão do Brics e os interesses do Brasil

Historicamente, o denominador comum entre os países originais do Brics era a reunir nações emergentes com perspectivas promissoras para escapar da unipolaridade que se delineava no ocaso da Guerra Fria

opinião 3008 -  (crédito: Caio Gomez)
opinião 3008 - (crédito: Caio Gomez)
postado em 30/08/2023 06:00

OTÁVIO SANTANA DO RÊGO BARROS

No último final de semana, encerrou-se em Joanesburgo, na África do Sul, a Cúpula do Brics, organização que encerra Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Esse representativo grupo de países emergentes se articulou na década de 1990 com a finalidade depromover medidas de crescimento econômico e desenvolvimento social sustentável. Ganhou importância e notoriedade, firmando-se ao longo dos anos no conceito entre nações.

Ao final da reunião deste ano, o presidente Cyril Ramaphosa, da África do Sul, anfitrião do evento, anunciou que o grupo formulará um convite para que Arábia Saudita, Argentina, Egito, Emirados Árabes, Etiópia e Irã se juntem aos fundadores em uma nova conformação da organização. Caso esses convites sejam aceitos, a organização contará com 11 países, cada um com características múltiplas nos aspectos psicossociais, econômicos, militares, tecnológicos e políticos.

Historicamente, o denominador comum entre os países originais do Brics era a reunir nações emergentes com perspectivas promissoras para escapar da unipolaridade que se delineava no ocaso da Guerra Fria.
Hoje, a assimetria entre os atuais integrantes é claramente percebida e se aprofundará ainda mais com a entrada desses novos parceiros. China, com o exponencial crescimento do poder econômico e tecnológico, Índia, com mão de obra cada vez mais qualificada, e Rússia, com poderio militar ainda inquestionável, se descolaram do Brasil e da África do Sul que se atrasaram em suas caminhadas.

Quanto aos novos integrantes do bloco, observa-se o reconhecimento da velha economia do hidrocarboneto, sem dúvidas ainda relevante, mas em declínio na matriz energética, e a tentativa de apontar o farol para países importantes, todavia com atuação mais regional. Nesse contexto, está difícil encontrar claras vantagens na expansão do bloco que justifiquem o esforço de tentar equilibrar as diferenças entre tantos países. Como Napoleão disse uma vez: “dividir para conquistar”.

Alguns analistas acham que o Brics corre o risco de se tornar um grupo ideológico e revisionista. Sob liderança da China, em corrida pela afirmação de seu papel na geopolítica mundial contemporânea, avaliam que a organização buscará se fortalecer para contrapor-se ao Ocidente. Vamos agora considerar o contexto em que o Brasil se insere nessa nova situação e iluminar os desafios.

O general Golbery do Couto e Silva afirmou que, como em toda perspectiva geopolítica, a condição geográfica do Brasil deveria ser considerada, mas o pertencimento ao Ocidente precisaria ser visto como ideacional, e seus elementos essenciais seriam a democracia liberal e o cristianismo. Com as alterações recentes nas relações entre países, os princípios de Golbery ainda são vigentes? Tendo a acreditar que sim.
A China, embora paciente e pragmática, a cada dia demonstra querer subir ao ringue e disputar o cinturão de peso pesado da hegemonia mundial em uma luta Leste versus Oeste.

A postura antiocidental do gigante asiático, decorrente dessa disputa, possivelmente arrastará os parceiros do Brics a uma posição de divergência quanto à política externa da águia americana. Essa nova tecitura de poder atenderá aos interesses brasileiros? É de conhecimento público que a expansão do número de países do Brics foi uma proposta da China. No jogo de interesses, o que poderia aquele país ter prometido aos demais integrantes como moeda de troca que justificasse essa eventual mudança de rumo? As respostas a essas dúvidas virão com o tempo. Em rápida análise, elas não me parecem favoráveis ao nosso projeto de país mais poderoso, independente, respeitado e passível de influir nas decisões regionais e globais.

Equilíbrio sempre foi uma virtude elogiada nas nossas relações internacionais. Uma suposta nova postura ofenderia princípios seculares de nossa diplomacia. Uma diplomacia que tem em Rio Branco seu reconhecido patrono e que sempre buscou uma abordagem harmoniosa entre polos divergente. Uma diplomacia que, acima de tudo, se pautou em ações pragmáticas para resolução de nossos desafios e que agora terá um papel fundamental em aconselhar o governo de turno para proteger nossos ativos físicos, emocionais e humanos.

Estamos confiantes, embora atentos aos ensinamentos do Diálogo de Melos: “Deveis saber que o justo, nas discussões entre homens, só prevalece quando os interesses de ambos os lados são compatíveis, e que os fortes exercem o poder e os fracos se submetem”.

OTÁVIO SANTANA DO RÊGO BARROS, general da reserva, foi chefe do Centro de Comunicação Social do Exército

Gostou da matéria? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:
Ícone do whatsapp
Ícone do telegram

Dê a sua opinião! O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores pelo e-mail sredat.df@dabr.com.br

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação
-->