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Políticas Públicas

Artigo: Ancorar navios no vazio

Dinheiro público tem que ser usado com eficiência, de forma imparcial, transparente, célere, eficaz, participativa, de modo legal e moral, alcançando a finalidade do recurso. O não uso é inaceitável

Para indicar a viabilidade do número, a pasta apontou que, de R$ 30 bilhões desse tipo de receita estimados para 2023, já foram alcançados R$ 21,9 bilhões ao final do primeiro semestre -  (crédito: Caio Gomez)
Para indicar a viabilidade do número, a pasta apontou que, de R$ 30 bilhões desse tipo de receita estimados para 2023, já foram alcançados R$ 21,9 bilhões ao final do primeiro semestre - (crédito: Caio Gomez)
postado em 24/08/2023 06:00

STYVENSON VALENTIM

“E agora, José?/ A festa acabou,/a luz apagou,/o povo sumiu,/a noite esfriou”. Pensei nestes versos do Carlos Drummond de Andrade quando apresentei o Projeto de Lei (PL) 511/2023. Pensei nas pessoas, nos Josés, nas Marias, que não receberam educação, saúde, segurança, transporte, por que o dinheiro enviado não chegou.

Esse PL foi aprovado na terça-feira (15/8), na Comissão de Segurança Pública do Senado e especifica como ato de improbidade administrativa a perda de recursos públicos decorrentes de transferências voluntárias da União ou de instituições internacionais, ou o retardo na sua aplicação. O projeto recebeu parecer favorável do senador Esperidião Amin e foi lido na comissão pelo senador Hamilton Mourão. Ele agora vai ser analisado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), em caráter terminativo.

Dinheiro público tem que ser usado com eficiência, de forma imparcial, transparente, célere, eficaz, participativa, de modo legal e moral, alcançando a finalidade do recurso. O não uso é inaceitável. Quem perde quando um recurso é enviado e não é usado? Com certeza não são os amigos de momento, os puxa-sacos, os que não têm nada a perder.

Aonde nasce o crime? Ele também nasce em cada lugar em que o estado fecha o olho, mesmo com o dinheiro destinado. Ele nasce quando cada político eleito para o Executivo, ao sentar na cadeira, esquece porque está ali, e que é o pior: quem o colocou naquele lugar e para quê.
O crime nasce em cada escola que perde recurso quando os gestores públicos fecham os olhos e demoram para fazer o que sabem que tem que ser feito. Fingem esquecer das reformas, dos livros, entre tantas ações necessárias.

Eles não ligam. Muitas possibilidades são jogadas numa caixa sem fundo chamada “restos a pagar”. O crime nasce quando o político esquece que pior que seu adversário ter um projeto executado e ajudar a comunidade, será ter seu filho aliciado pelo crime.
Isso se ele mesmo não for morto por um jovem que perdeu a fé na família, na escola, nele mesmo, por que nada aconteceu. Seus sonhos viraram pó de crack. Depois vem alguém com aquele papo furado de que “faltou dinheiro”. O que mais falta mesmo é vontade de fazer, é olhar algo além do próprio umbigo ou do partido.

Os princípios da moralidade, da impessoalidade e da eficiência administrativa são tratados de maneira indecente, por razões vergonhosamente político-partidárias. Eles costumam, de modo canalha, se escorar na exigência de prova de dolo específico de lesionar o erário. O erário somos nós. Temos que fazer o dinheiro chegar ao destino correto. Corrupção mata, mas comodismo e omissão também. A omissão é a arma dos mentirosos, covardes e incompetentes.

Termino com um poema de Ada Lima (poetisa de Areia Branca/RN): “O pânico que me escorre das mãos/ não é outro/senão/ o de ter que ancorar navios/ no vazio”.

STYVENSON VALENTIM, senador (Podemos/RN) e quarto secretário da da Mesa Diretora da Casa

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