CRISTIANE AJ SCHMIDT - A Proposta de Emenda Constitucional 45 (PEC 45) é a primeira fase da Reforma Tributária — relativa ao consumo —, que unifica cinco tributos (IPI, PIS, COFINS, ISS e ICMS) em dois: um federal, o CBS; e outro, que engloba os demais entes, o IBS. Fala-se em “primeira etapa”, porque à frente virão outras Reformas, como a da renda e a da folha. Conquanto as outras possam ter caráter distributivo, a PEC 45 objetiva aumentar a produtividade da economia, com foco no crescimento sustentado do Brasil.
Talvez por isso a reforma do consumo tenha vindo antes das demais: a sua urgência. Foi uma decisão política feita no início do governo Bolsonaro. Em 2019, o deputado Baleia Rossi apresentou a PEC 45, cujo conteúdo foi embasado em estudo do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), e o senador David Alcolumbre, a PEC 110, baseada em proposta do deputado Luiz Carlos Hauly (PEC 293/2004). O governo federal, por sua vez, propôs o Projeto de Lei 3887, em 2020, com a instituição da CBS. O Comitê de Secretários de Fazenda, Economia e Tributação (Comsefaz) alvidrou modificações nas PECs através das emendas 192 (PEC 45) e 21 (PEC 110); e uma carta em apoio a estas PECs foi assinada em 2022 pelos 27 governadores.
Depois de 30 anos de discussão, ambos os poderes e os estados entenderam que era o momento para avançar sobre os pontos que impediam a sua aprovação no Congresso Nacional. Em 2023, destarte, os presidentes da Câmara e do Senado e o relator, com apoio do Ministro da Fazenda, optaram por tramitar a PEC 45, incluindo aspectos da PEC 110, das emendas do Comsefaz e das contribuições da sociedade. O debate, assim, foi intenso e independente de partido político ou de governo. Trata-se de uma reforma em prol do Brasil. Não por menos, houve aprovação expressiva da PEC 45 na Câmara (382 a favor no primeiro turno e 375 no segundo).
Enfatiza-se que o propósito desta reforma é criar os incentivos para que a produtividade da economia brasileira aumente. Não é uma condição suficiente, mas é necessária. O foco não é aumentar a eficiência da máquina pública (ainda que isso ocorrerá), mas tirar as pedras do caminho do setor privado. Deveras, ambiciona-se atacar um dos eixos do “custo Brasil”, que impossibilita que o Brasil cresça sustentavelmente. As dificuldades burocráticas, estruturais e trabalhistas afetam negativamente o ambiente de negócios, encarecem os custos logísticos, comprometem os investimentos e desfavorecem o crescimento econômico e a sua eficiência. É isso que esta Reforma (não qualquer uma, mas esta, a da PEC45) endereçará. Observa-se que, no tocante aos tributos, há dois tipos de “custos Brasil”.
Um destes refere-se à elevada carga tributária que o Brasil tem hoje (34% do PIB) vis-à-vis a de seus pares (15% a 25% do PIB), o que diminui a competitividade do país. Outro tipo, diz respeito à sua complexidade. A PEC 45 foca no segundo ponto, mirando a simplificação e a transparência. No lugar de 5.568 legislações municipais, 27 estaduais e as federais (todas extensas, confusas e com diversas exceções), haverá uma legislação, com interpretação uniforme em todo o país e com os fiscos atuando coordenadamente. Com isso, o contencioso tributário reduzirá drasticamente, logo, a necessidade de se ter um “arsenal” de contadores e advogados. O tempo e o dinheiro do empresário serão canalizados para a sua produção e geração de emprego e renda, não em lidar com as diversas
burocracias.
A PEC 45, por sua vez, não alterará a atual carga tributária. Será mantida a arrecadação daqueles cinco tributos como proporção do PIB. Para isso ocorrer com a menor alíquota possível, é necessário tempo de transição para, sobretudo, observar como reagirá o “gap de conformidade” (sonegação, elisão fiscal, inadimplência e judicialização), cuja redução permite manter a arrecadação com uma alíquota menor. Para além desta incerteza, desconhece-se, também, quais exceções constarão do texto final (quanto mais tratamentos favorecidos, maior a alíquota). Logo, ainda que se faça hipóteses hoje sobre uma alíquota estimada, esta será endógena às decisões do Congresso e ao processo em si.
Em suma, conquanto o debate sobre as despesas públicas seja urgente, para que se possa reduzir a carga tributária, é fato que dirimir a complexidade tributária é condição necessária para que o contribuinte, que paga muito imposto e recebe péssimos serviços pelo estado, possa ser mais produtivo e competitivo. A PEC 45 é um importante início. Que o Senado a lapide com cuidado.
CRISTIANE AJ SCHMIDT, doutora pela EPGE/FGV, ex-secretária da Economia de Goiás, Conselheira do Cade e colaboradora do Instituto Millenium
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