O enfrentamento do feminicídio está entre os grandes desafios do Estado e da sociedade. Ontem, em meio à 7ª Marcha das Margaridas, que reúne cerca de 100 mil mulheres, em Brasíllia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou o Pacto Nacional de Prevenção dos Feminicídios. A gestão do pacto será do Ministério da Mulher. No ano passado, 1.437 vítimas. Elas foram mortas por serem mulheres. Na maioria dos casos, o assassino era o ex, ou companheiro, ou um familiar. O ato extremo era o ápice de uma escala crescente de atitudes violentas, como humilhação, pressão psicológica, xingamentos e espancamentos.
Apesar do aumento do número de ocorrências, o governo passado reduziu em 90% os recursos destinados às políticas públicas de proteção às mulheres. A violência contra as mulheres é caótica no país, inclusive na capital da República, onde 24 foram assassinadas pelo ex ou atual companheiro — média de três homicídios por mês, de janeiro até agora. Um patamar inadmissível. Elas recorrem à Polícia, vão ao Judiciário, que lhes dão direito à medida protetiva. Mas, em vez de o agressor ser contido, é a medida protetiva que fica presa no papel. O potencial assassino fica livre para, no momento que lhe aprouver, executar a vítima.
Em 2022, Minas Gerais ocupou a segunda posição em número de feminicídios registrados no país — 171 mulheres foram assassinadas —, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Nos primeiros meses deste ano, o estado registrou 11 casos e 14 tentativas. O pacto prevê a entrega de 270 unidades móveis para acolhimento e orientação, além de 10 carros — metade para locomoção de equipes e o restante para transportar equipamentos de atendimento às usuárias. As comunidades de florestas, ribeirinhas e do Pantanal contarão com o serviço por meio de embarcações.
Embora o pacto anunciado pelo presidente seja um indicativo de que o tema preocupa o governo federal, os primeiros passos parecem muito tímidos, ante as diferentes expressões de violência que ocorrem nos meios urbano e rural. Há uma incapacidade do poder público de garantir a prevenção das agressões sofridas pelas mulheres. Faltam medidas mais enérgicas contra os homens que ameaçam e agridem as ex ou a companheira, após ela recorrer ao sistema de segurança e denunciá-los. O poder público garante que trabalha em projetos e programas de proteção às mulheres, ante o avanço do número de feminicídios.
Como as medidas protetivas, as ações reiteradamente não conseguem passam de discursos e planos que, se existentes, estão contidos em papéis. Promessas que não são cumpridas. Enquanto isso, as ameaças dos algozes se concretizam com mais um corpo feminino que sucumbe no chão. Em sua maioria, cresce o número de órfãos, de famílias enlutadas e destroçadas ante a indomável violência masculina.
Há um farto conjunto de número de telefones para que as agredidas ou as ameaçadas recorram e peçam ajuda e proteção. As mortes, no entanto, permitem supor que esse caminho, via ligação telefônica, não funciona adequadamente. Como também não resulta em proteção denunciar, pessoalmente, a ameaça à delegacia ou à Justiça. Há de se indagar se não seria o caso de rever a estratégia, até agora ineficaz, oferecida às mulheres ameaçadas, espancadas, estupradas, vilipendiadas por seu ex ou companheiro.
Nos debates sobre o tema, autoridades e especialistas apontam as mais diferentes opções de solução. Desde a educação nos primeiros anos de escolaridade até as jurídicas. Porém o número de vítimas segue crescendo. Ou seja, a violência contra as mulheres é notícia diária nos meios de comunicação, não só na capital da República ou em Minas Gerais. É fato noticiado em todo o país. Uma das alternativas é ampliar o número de Casa da Mulher, espaço de acolhimento e abrigo das vítimas. Não seria o caso de criar a Casa do Homem, onde ele seria reeducado a conviver com respeito à mulher? Não seria necessário detê-lo, como sugeriu uma autoridade do Executivo distrital? Cabe ao poder público e aos especialistas encontrar uma solução efetiva para erradicar os feminicídios.
É inadmissível que, em pleno século 21, o machismo e o patriarcalismo sigam regendo a vida das mulheres, como se elas fossem objeto de propriedade masculina. Inadmissível que, com os inúmeros recursos tecnológicos, com a evolução dos conceitos jurídicos, o poder público ainda não tenha encontrado um meio de conter a fúria dos homens nem garanta a devida atenção às denúncias e assegure a proteção exigida à vida das mulheres. Até quando elas continuarão sendo imoladas?
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