A violência na América Latina se banalizou por completo. O assassinato de Fernando Villavicencio, candidato à Presidência da República no Equador, na última quarta-feira, foi apenas mais um capítulo das tragédias que têm se repetido em toda a região, tomada pelo crime organizado e pelo narcotráfico. Para onde quer que se olhe, os índices de homicídios na guerra urbana não param de subir. E, agora, o descalabro avança sobre a política, colocando em risco a democracia. As eleições equatorianas estão mantidas para 20 de agosto, e o país decretou Estado de exceção.
Villavicencio foi o terceiro político assassinado no Equador neste ano. No mês passado, o candidato ao Legislativo Rider Sánchez foi morto na cidade de Quinindé, a noroeste do país. Em fevereiro, Omar Menéndez teve a vida ceifada a tiros um dia antes das eleições em que saiu vitorioso, com 46,2% dos votos, para prefeito de Puerto López. Esses crimes coincidem com o salto impressionante nos indicadores de violência no país. Em 2017, o Equador chegou a ter o menor número de homicídios por 100 mil habitantes: 5,8. Agora, esse índice subiu para 36, próximo de países em guerra.
Ao sul da América Latina, a Argentina vive o mesmo fenômeno de descontrole da violência às vésperas de eleições. Três mortes nos últimos dias colocaram o tema nos debates dos presidenciáveis, estimulando discursos populistas, em especial da extrema-direita. A menina Morena Domínguez, 11 anos, morreu depois de ter a mochila roubada na porta da escola por dois motoqueiros. O manifestante de esquerda Facundo Morales, 47, teve um mal súbito ao ser detido pela polícia em uma manifestação. O médico Juan Carlos Cruz, 52, faleceu ao ser baleado quando ladrões roubavam o carro dele.
A Argentina sempre foi uma das nações mais seguras da região. Mas políticas equivocadas, que empurraram o país para a mais grave crise econômica de sua história, com 40% da população na pobreza, mudaram a realidade dos argentinos. A taxa de homicídio no país vizinho alcançou 4,2 homicídios por 100 mil habitantes, ainda bem distante do índice brasileiro, de 19,5. O clima de insegurança perturba os eleitores, que apontam o tema como o mais importante depois da inflação galopante. A região metropolitana de Buenos Aires concentra quase 40% dos crimes.
Dados recentes do Fórum de Segurança Pública mostram que o número de homicídios no Brasil caiu ao menor nível em uma década. Porém, quase 50 mil pessoas ainda são vítimas de armas de fogo todos os anos. Crimes como estupros e feminicídios batem recorde. Jovens negros são os que mais morrem nessa guerra diária. Entre setembro de 2020, às vésperas de eleições municipais, e 2 de outubro de 2022, primeiro turno do pleito presidencial, foram identificados 523 casos de violência política, sendo 54 assassinatos de candidatos a cargos eletivos e de pessoas com mandatos. Cinco anos se passaram, e até hoje não se sabe, efetivamente, quem mandou matar a vereadora Marielle Franco e o motorista dela, Anderson Gomes.
A luta contra a violência na América Latina tornou-se mais do que urgente. Exige uma ação coordenada de todos os países da região para combater o narcotráfico e as organizações criminosas que têm se mostrado, em alguns países, fortes o suficiente para enfrentar os poderes constituídos na tentativa de fazer valer seus interesses. A ramificação desses grupos é tão ampla que ações isoladas de nada adiantarão. Ou os governos se unem, ou o Estado paralelo passará a dar as cartas, corrompendo os que têm o poder da caneta, o Judiciário e aqueles que fazem as leis.
O enfrentamento não poderá se restringir a medidas na área de segurança. Passa por políticas eficientes e inclusivas na economia, de forma que os jovens que se sentem excluídos não sejam cooptados pelo crime. Essa não pode ser uma guerra perdida, pois as consequências serão pesadas para todos.
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