O mercado de carbono está no centro das atenções. Com a ameaça das mudanças climáticas batendo à porta e a renovação dos compromissos desde o Acordo de Paris, muitos novos players ingressaram neste setor, novas iniciativas têm surgido, mais recursos têm sido canalizados e novas fronteiras vêm sendo testadas. Isto tudo é muito positivo, pois os projetos financiados por recursos do mercado de carbono são cada vez mais necessários. Entretanto, com este crescimento, vem também uma confusão de conceitos, além de atores com práticas questionáveis e muitas críticas. Por isto, antes de se discutir onde estamos e para onde vamos com o mercado de carbono, é importante relembrar a que veio o crédito de carbono, o que não é e o que de fato é.
Resumidamente, o crédito de carbono é um incentivo financeiro, uma espécie de subsídio, para que uma atividade que reduza ou capture gases de efeito estufa aconteça. Ao contrário do que pode parecer, ele não é a finalidade de um projeto que visa a conservação florestal, restauração florestal, recuperação de áreas degradadas, energias renováveis, tratamento de resíduos ou a melhorias de práticas agrícolas, por exemplo. Ele é exatamente o meio, o mecanismo de financiamento que mantém viável financeiramente as atividades mitigadoras das mudanças climáticas por agentes que o fazem obrigatória ou voluntariamente.
Cada crédito de carbono representa uma tonelada de gases de efeito estufa equivalente que foi evitada de ser emitida ou foi capturada da atmosfera com atividades promovidas para este fim. E os projetos e iniciativas recebem recursos do mercado de carbono, de acordo com a quantidade de redução ou captura que conseguiram fazer, ou seja, segundo a quantidade de créditos que conseguiram gerar.
O crédito de carbono não é uma certificação ou um selo que vai permitir que um produto tenha um preço premium no mercado. Não é um atestado de que a empresa atingiu determinado nível de qualidade ou sustentabilidade, e não é uma criptomoeda que veio exclusivamente para reservar valor e fazer com que seus investidores tenham retornos financeiros. A lógica é até contrária: se eu tenho uma operação com alta intensidade de carbono e dificuldades para financiar ou realizar uma transição, o crédito de carbono entra para incentivar a mudança.
O crédito de carbono é um elemento dos instrumentos de precificação de carbono. Estes instrumentos têm por finalidade promover mudança de comportamento na sociedade para que possamos salvar não o planeta, porque mesmo se a vida acabar, o planeta permanecerá, mas preservar as condições estáveis climáticas que permitem a vida humana e dos ecossistemas como a conhecemos.
Recentemente, o mercado sofreu com os impactos da guerra da Ucrânia, abalos econômicos dos bancos internacionais, com preços e volumes caindo, mas a tendência ainda é de crescimento. Precisamos mudar os esforços de patamar. E, sim, por estes esforços, precisamos falar de qualidade dos créditos de carbono, que tem um enorme espaço para melhorar.
Devemos fazer, primeiramente, a lição de casa de nos educarmos sobre o assunto, para evitar a tentação de cair em contos aventureiros de promessas e dinheiro fáceis. A partir daí, vamos nos debruçar sobre as diversas ferramentas e instrumentos que já existem e se complementam, como os mecanismos de precificação de carbono, metodologias de contabilidade de carbono, muitas experiências de ação no campo e novas tecnologias para, juntos, os aperfeiçoarmos e acelerarmos as reduções de emissões a níveis que nos permitam continuar vivendo em uma Terra como a conhecemos.
Importante dizer que o crédito de carbono não é bala de prata para resolver as mudanças climáticas. A maior parte do esforço para a mitigação deve vir da redução de emissões da porta para dentro das organizações, da adoção de uma matriz energética de baixo carbono, da redução de geração resíduos ou adoção de novas tecnologias. Mas o acesso ao crédito de carbono, gerado por projetos externos à organização ou de sua cadeia de valor, está aí para permitir o esforço adicional alcance o nível das emissões líquidas zero, que precisamos atingir como planeta até 2050, se quisermos manter a vida na Terra como a conhecemos.
*MARIAMA VENDRAMINI - Diretora-geral da Ecosecurities no Brasil
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