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Artigo: Carências de uma cidade sem prefeito

Brasília não tem prefeito, mas bem que o governador poderia agir como tal, e adotar esse lema como rotina. Se o fizer, vai se espantar com tantas providências que teria que adotar ao chegar em seu gabinete

O vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, ainda como governador de São Paulo e depois como candidato à Presidência da República, bradava em seus discursos que o bom mesmo em política é ser prefeito de uma cidade. Com entusiasmo, Alckmin comentava que um prefeito atuante já sai de casa prestando atenção em tudo que a cidade mostra. E vai anotando os problemas que vê pelas ruas, como buracos a ser tapados, postes de iluminação, esgotos a céu aberto e por aí vai. Quando chega na Prefeitura, parte da agenda de providências está pronta, só executar.

Brasília não tem prefeito, mas bem que o governador poderia agir como tal, e adotar esse lema como rotina. Se o fizer, vai se espantar com tantas providências que teria que adotar ao chegar em seu gabinete. Claro, se a causa lhe interessar, a primeira anotação seria sobre o trânsito caótico que aos poucos leva o brasiliense a um stress diário, com poucas perspectivas de melhoras a curto prazo.

A única preocupação, que nunca sai da pauta do Governo é a desordenada cobrança de multas aos usuários, medida que Brasília se orgulha de ser uma das cidades que mais adota. Ainda no trânsito, o governador poderia anotar num bloquinho, no banco de trás, um absurdo número de faixas de pedestres esquecidas e abandonadas pelo Departamento de Trânsito (Detran), do motivo de orgulho de Brasília, a faixa representa segurança, e como tal deveria ser melhor tratada. Algumas sequer são percebidas pelos pedestres, desgastadas pelo tempo. Outro item que talvez figurasse na agendinha do governador são as minúsculas e desapetrechadas paradas de ônibus. Desconfortáveis, sujas e sem manutenção, não abrigam mais do que dez usuários, tampouco os acalenta do sol e da chuva, no inverno ou no verão. São raras as que apresentam o mínimo de conforto, e outras tantas servem de mictórios sem descargas.

Também não pode faltar na agendinha do governador, uma rápida e atenta observação ao trabalho efetuado pela Novacap, na instalação de algumas calçadas e passeios públicos, espalhados pela cidade. Algumas, ou maioria, bem distante do que realmente uma cidade como Brasília deveria apresentar à comunidade. Grande parte feita com visível cara de improviso, péssimo acabamento e instaladas com a qualidade técnica discutível.

Nos dias de hoje, o Lago Sul por exemplo, está recebendo quilômetros dessas calçadas de concreto. Os moradores elogiam, mas fazem a inevitável censura e criticam o acabamento apresentado. É comum o cidadão esbarrar nos postes de iluminação que, estranhamente, não foram retirados no caminho traçado pelas calçadas. Quem duvidar, fácil constatar.

Dessa agenda, caso um dia se torne realidade, o governador poderia incluir uma visita às escadas rolantes da Rodoviária, às passagens subterrâneas sob as vias auxiliares Sul e Norte e ainda dar uma passada nas obras de duplicação das pistas que atendem as áreas dos condomínios próximos ao Jardim Botânico. Naquele setor, pendegas judiciais impedem há meses que as pistas sejam duplicadas, e os moradores enfrentam congestionamento gigantescos pela manhã e final da tarde, todos os dias. O mesmo acontece com as pistas que ligam Sobradinho e Planaltina ao Plano Piloto, um retrato vivo e diário do caos no trânsito.

Uma outra providência que a cidade cobra, e por certo poderia fazer parte da agendinha do governador, são os reparos nas camadas de asfalto que, com frequência, a Novacap faz pela cidade. O reparo é necessário, mas a forma como vem sendo feita carece de mais cuidado. Quem dirige pela cidade já se acostumou com as visíveis saliências deixadas pelos revestimentos mal feitos nas pistas de rolamento.

A Ponte JK, desde que foi inaugurada 20 anos atrás, nunca recebeuuma lata de tinta que melhore seu visual já desgastado e amarrotado pelo tempo. O Teatro Nacional, fina estampa do nosso orgulho turístico e cultural, implora por uma reforma que lhe devolva a dignidade e vigor para receber arte, artistas e o público.

Sabidamente, obras públicas no Brasil raramente são entregues dentro dos prazos estabelecidos. Item que também poderia fazer parte da agenda de providências do governador, a comunidade agradeceria. Na plenitude de seus sessenta e três anos, Brasília, como capital da República e cidade tida como modelo de arquitetura e urbanismo, merece um olhar mais carinhoso e afetivo de seus governantes. Se o governador, vez por outra, escolher um dia da semana para se vestir de prefeito, e sair pelas ruas da cidade, vai notar que por aqui há algo mais pra se ver além dos jogos do Flamengo e as áreas nobres já abençoadas por Deus e bonitas por natureza.

 JOSÉ NATAL, jornalista

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