O Brasil precisa implantar urgentemente uma política pública capaz de conter a drástica redução da quantidade de jovens brasileiros com acesso ao ensino superior na faixa etária adequada. A despeito do crescimento de 11,9% nas matrículas no ensino superior entre 2015 e 2021, os dados mostram que a diminuição do número de jovens no ensino universitário tem ocorrido em uma proporção ainda maior que a própria queda na população dessa mesma faixa etária. E que o Brasil tem uma das taxas de escolarização líquida no ensino superior mais baixas do mundo, que em vez de evoluir vem regredindo.
A população de jovens de 18 a 24 anos caiu 2,99%, de 2019 a 2021, mas o número de matriculados no ensino superior na mesma faixa etária caiu o dobro: 5,98%. A população de jovens nessa idade, que era de 23,78 milhões em 2019, chegou a 23,07 em 2021, e segundo o INEP, o total de 4,35 milhões de alunos de 18 a 24 anos matriculados em 2019 caiu para 4,09 milhões, em 2021.
O Plano Nacional da Educação (PNE) estabelece que o Brasil deveria atingir 33% de taxa de escolarização líquida até 2024, ano em que se encerra a validade do Plano, e é evidente que o país não apenas não vai atingir esse objetivo como ainda tem se afastado do percentual projetado: em 2019, a taxa era de 18,3% e, em 2021, caiu para 17,7%.
Dois fatores explicam essa redução. O primeiro é a evasão no ensino básico, sobretudo no ensino médio. O segundo aspecto é a falta de poder aquisitivo dos jovens e de suas famílias para permitir o seu ingresso e permanência no ensino superior.
Não podemos esquecer que no Brasil 87,8% das IES são privadas. As formas de acesso à educação superior são a disputa pelas poucas vagas gratuitas ofertadas pelas IES públicas, ou a matrícula em um curso pago de uma IES privada. O desafio é que maioria não tem condições de concorrer às vagas das IES públicas, nem pagar as mensalidades. Dos estudantes que acessam o ensino superior privado, 89,3% têm renda de até 3 salários mínimos e 50,62%, de até 1,5 salário mínimo. Mesmo os que obtêm uma vaga gratuita não conseguem se manter estudando, porque não têm recursos para cobrir as despesas de transporte, alimentação, material didático.
A forma mais eficiente de garantir o acesso dos jovens mais carentes à educação superior seria por meio de programas como o Prouni e o Fies. Mas o acesso por esses programas só vêm diminuindo. Em 2014, 21,3% ingressaram pelo Fies e, em 2021, apenas 0,9%. Por meio do Prouni, em 2014, ingressaram 6,3% e, em 2021, apenas 2,6%.
Na eleição do ano passado, uma das plataformas de campanha do presidente eleito era recuperar e ampliar o acesso dos jovens ao ensino superior. Passado um semestre, ainda não temos notícia da ampliação dos programas existentes, ou de novos programas. No entanto, a curto prazo, considerando a falta de recursos do governo para investimentos, haveria três caminhos concomitantes que poderiam ser buscados.
O primeiro deles seria ampliar o sistema de cotas em IES públicas, nas quais atualmente são reservadas 50% das vagas. A política de cotas se revelou um sucesso, por que não ampliar?
Em relação ao ProUni também existe um caminho a ser seguido. Atualmente cada IES que participa do programa oferece aproximadamente 10% das suas vagas em troca de renúncia fiscal de tributos (PIS, COFINS, CSLL e IRPJ) e isso representa um custo 80% menor para o Estado em relação às vagas em universidades públicas. Por que não ampliar o percentual de vagas por meio da troca dos encargos sobre a folha de pagamento por mais bolsas?
O terceiro caminho seria a ampliação do Fies. Hoje, apenas 100 mil vagas são ofertadas pelo programa e sabemos que não há recursos para ampliação nos mesmos níveis do período de 2010 a 2014. Por que não chegar em 200 mil por meio de uma revisão das regras de acesso? O modelo atual é tão rígido que nem metade das 100 mil vagas ofertadas são preenchidas. O Fies precisa voltar a financiar 100% da mensalidade, ser acessível a qualquer momento do ano e repensar os critérios de renda limite.
Programas de acesso à educação superior bem estruturados não beneficiam apenas o indivíduo, que vai sair do ciclo da pobreza, ter ascensão profissional e ganho maior de renda, além de consciência participativa e cidadã, mas representa principalmente um investimento capaz de assegurar retorno também para o país em termos sociais e econômicos.
LÚCIA TEIXEIRA, presidente do Semesp, entidade que representa mantenedoras de ensino superior no Brasil