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Artigo: Aplicação do Acuerdo de Escazú na jurisprudência do TRF 1ª Região

No contexto da proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, defendo que os princípios da precaução e da prevenção permitem que fatos científicos ou que buscam evitar externalidades negativas em desfavor dos biomas naturais e das comunidades indígenas sejam considerados

No contexto da proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, defendo que os princípios da precaução e da prevenção permitem que fatos científicos ou que buscam evitar externalidades negativas em desfavor dos biomas naturais e das comunidades indígenas sejam considerados. Esses fatos podem emergir de soft law ou de tratados internacionais ainda não incorporados pelos Estados nacionais, mesmo que não tenham relevância explícita para a proteção dos próprios Estados. Nesse sentido, anuncio que, como desembargador federal da Sala Ambiental no Brasil, fui o primeiro juiz a aplicar o Acuerdo de Escazú em casos individuais ou coletivos, considerando-o crucial para promover a justiça ambiental na América Latina e no Caribe.

Embora não tenha havido a ratificação e incorporação definitiva do Acuerdo de Escazú no sistema interno brasileiro, é fundamental reconhecer a relevância desse pacto pioneiro, que vai além das normas ambientais internacionais existentes, protegendo unidades de conservação ambiental, defensores das florestas e garantindo acesso democrático a informações ambientais de interesse público. Politicamente, é necessário refletir sobre a necessidade de acelerar os trâmites para sua plena incorporação, a fim de garantir a proteção adequada do meio ambiente e promover a justiça ambiental em nossos países.

No âmbito jurisdicional, diante de magistrados ambientais independentes e comprometidos com a máxima proteção dos direitos humanos e da natureza, é imperativo adotar métodos de interpretação contemporâneos para cumprir o dever de respeitar a ciência do Acuerdode Escazú. Diante da inatividade política, juízes imparciais, corajosos e determinados, comprometidos com os princípios mais essenciais de uma Constituição da Terra, devem agir como motores de aceleração para a preservação biocêntrica, encorajando governos e a sociedade do continente como um todo a abraçar o Acuerdo de Escazú, sua importância e buscando sua efetiva incorporação.

A proteção ambiental não é uma escolha, mas uma necessidade urgente para a preservação de nosso planeta e o bem-estar das presentes e futuras gerações. O Acuerdo de Escazú representa um compromisso coletivo em prol da justiça ambiental. É hora de agir, de promover ações concretas e de criar um futuro sustentável para todos. A incorporação desse acordo em nosso sistema jurídico é uma etapa essencial nessa jornada. Juntos, podemos moldar um mundo melhor, onde a proteção ambiental e a justiça caminhem lado a lado.

Nesse contexto, a colenda Quinta do TRF 1ª Região decidiu, por unanimidade, na sessão de julgamento de 28 de junho de 2023, a aplicação do Acordo de Escazú, dentre outros julgados anteriores, sob a minha relatoria, na inteligência de que a garantia dos direitos humanos dos povos indígenas, incluindo a participação no processo decisório e de acesso ao meio ambiente, justifica a adoção do referido e histórico Acordo Regional sobre Acesso à Informação, Participação Pública e Acesso à Justiça em Assuntos Ambientais na América Latina e no Caribe, que constitui "o único acordo juridicamente vinculante derivado da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio 20), o primeiro tratado sobre assuntos ambientais da região e o primeiro no mundo que inclui disposições sobre os defensores dos direitos humanos em assuntos ambientais", sendo o Brasil signatário desse instrumento.

Com efeito, o Acordo de Escazú vai além das normas ambientais internacionais até então existentes, consagrando-se como um pacto regional pioneiro para a promoção de justiça ambiental e climática, uma vez que busca combater a desigualdade e a discriminação, assim como garantir os direitos de todas as pessoas a um meio ambiente saudável e ao desenvolvimento sustentável, na região da América Latina e Caribe, conferindo especial atenção às pessoas e grupos vulneráveis, colocando, dessa forma, a igualdade no centro do desenvolvimento sustentável (REsp 1.857.098/MS, relator Ministro Og Fernandes, DJe de 24/5/2022).

No intuito de harmonizar as normas regionais e internacionais de tutela ambiental, destaca-se, ainda, a Convenção de Aarhus, que não destoa no Acordo de Escazú, impondo às partes e autoridades públicas no âmbito da Europa e Ásia Central, obrigações relativas ao acesso à informação ambiental e à participação pública e o acesso à justiça ambiental.

Antônio Souza Prudente - Desembargador federal

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