É impossível saber quantos dos 4.915.423 eleitores de Simone Tebet votaram em Lula no segundo turno, após a senadora do MDB declarar seu apoio ao petista. Lula venceu a eleição pela estreita margem de 2.139.645 votos (1,8% do total). É justo atribuir a atual ministra do Planejamento importante papel naquela disputa que ocorreu voto a voto até seu final. O papel dela no atual governo transcende a sua atuação no Executivo. Ela é o símbolo do acordo que permitiu aos petistas fecharem o governo de coalizão e desembarcarem no Palácio do Planalto. Sem ela, nada feito.
Ela declarou apoio sem negociar cargo no futuro governo. Foi um gesto espontâneo que visava manter unido e proteger o centro democrático. Depois da eleição, seu nome foi especulado para diversos ministérios e terminou no Planejamento, do qual foram retirados importantes setores. Mas nele remanesceu o Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que faz o censo demográfico brasileiro de dez em dez anos e no período atualiza todas as estatísticas básicas nacionais. Com base nestes números, o governo faz a distribuição de verbas de acordo com a população dos estados e municípios.
A indicação de Marcio Pochmann para a presidência do IBGE chama atenção dos observadores e pode significar também profunda mudança na forma de atuar da instituição. Há entendimento, entre economistas com passagens por diferentes governos, que a confirmação de Pochmann traz riscos para o IBGE. O paralelo que se estabelece é com o Instituto Nacional de Estadística y Censos (Indec), da Argentina, que sob intervenção política modificou as estatísticas nacionais. Entre 2007 e 2015, houve manipulação de dados de inflação, pobreza e PIB que ficaram muito distante da realidade da economia argentina.
Quem critica Pochmann alega que ele assim procedeu quando dirigiu o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
(IPEA), um instituto criado pelos governos militares, dentro do Ministério do Planejamento, para realizar estudos de longo prazo e análises sobre a economia brasileira. A premissa básica da instituição era a liberdade para apresentar seus pontos de vista. Sob a presidência de Porchmann no final de agosto de 2007 a junho de 2012, no governo Lula 2 e durante Dilma1, ele demitiu funcionários que não concordavam com suas ideias e exigiu que todos os estudos fossem publicados depois de passar por sua análise. Não é por acaso que pessoas como Edmar Bacha, um dos pais do Plano Real e ex-presidente do IBGE diga que "a escolha de Pochmann para o IBGE é um perigo para as estatísticas".
Confusão nesta área deveria ser evitada a todo custo pelo presidente da República. Afinal de contas a agência de classificação de risco Fitch elevou a nota de crédito do Brasil de BB- para BB, com perspectiva estável. Com esta nova classificação, o país fica a dois degraus do grau de bom pagador que atesta a capacidade de o país honrar seus compromissos. Os grandes fundos de pensão e os maiores investidores só colocam dinheiro em países com grau de investimento. O Brasil já teve o grau de investimento. Perdeu a classificação como resultado do desastre econômico-financeiro promovido pelo governo Dilma Rousseff e seu ministro da Fazenda, Guido Mantega, que com sua política permitiu a retorno da inflação, a redução do nível de crescimento, aumento do desemprego e provocou profunda recessão econômica.
A desastrada experiência do governo Dilma Rousseff deve servir de exemplo a não ser seguido pela atual administração. As agências de risco atuam de maneira independente. Às vezes, erram como ocorreu na crise última financeira nos Estados Unidos quando deram aval a bancos que estavam virtualmente falidos. Mas acertam, sobretudo, na atenta observação da economia de países periféricos. E a análise da Fitch elogia o desempenho brasileiro na votação da reforma da Previdência, na reforma trabalhista, na reforma tributária e no novo arcabouço fiscal. Ou seja, o trabalho foi transversal e resulta dos esforços dos três últimos governos.
Neste momento, a inflação está em queda pronunciada, o que demonstra o acerto da política do Banco Central. As reservas estão preservadas na faixa de US$ 342 bilhões. Há confortável saldo no balanço comercial. E o desemprego começa a recuar de maneira efetiva. Não é razoável criar uma crise artificial justamente na seara do ministro Fernando Haddad que está conseguindo bons resultados apesar da desconfiança dos investidores brasileiros e estrangeiros. Ele conseguiu vencer resistências, mas, aparentemente, não conseguiu superar o bombardeiro do fogo amigo. Simone Tebet não aceitou a provocação. Acatou a nomeação de Pochmann sem reclamar. Engoliu o sapo em grande estilo.
*ANDRÉ GUSTAVO STUMPF, jornalista
Saiba Mais
Gostou da matéria? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:
Dê a sua opinião! O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores pelo e-mail sredat.df@dabr.com.br