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Reforma tributária

Artigo: Apelo ao Senado

A reforma como ideada e aprovada na Câmera não atende aos máximos anseios de racionalidade. Os prestadores de serviços serão massacrados, em que pese representarem 71% do PIB brasileiro em valores relativos

 21/06/2023. Crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press. Brasil.  Brasilia - DF. Votação no Senado Federal do Arcabouço Fiscal. -  (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)
21/06/2023. Crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press. Brasil. Brasilia - DF. Votação no Senado Federal do Arcabouço Fiscal. - (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)
postado em 29/07/2023 06:00

Este artigo é dedicado ao Senado da República e especialmente à Rodrigo Pacheco, presidente da casa a quem conheço. A reforma como ideada e aprovada na Câmera não atende aos máximos anseios de racionalidade. Os prestadores de serviços serão massacrados, em que pese representarem 71% do PIB brasileiro em valores relativos. Ocorre que são imperfeitas a capciosas, as razões do Congresso Nacional como neste artigo se demonstrará. O contribuinte perderá especialmente todo e qualquer tipo de prestador autônomo de serviços.

O aumento tem duas roldanas. Quanto mais sofisticado for o serviço maior a tributação. E, como é natural, quanto mais caro for maior tributação atrairá. Não nos restringiremos apenas ao tal "soi disant" imposto sobre o consumo intermediário e final de bens e serviços, IBS, seja uno ou dual, com natureza "não cumulativa", com a ilógica alíquota única de 25% (vinte e cinco) a 28% (vinte e oito por cento) como tem sido anunciado... Esse montante será dividido (União, Estados e Municípios).

Na Europa, temos um imposto geral sobre o valor acrescido (IVA em francês ou TVA em inglês). Aqui estão a falar em modernização, como convém, mas vão criar confusão. Todos os prestadores de serviço no Brasil excluídos os transportes não municipais, energia, telecomunicações e minerais do país que estão hoje sujeitos ao ICMS continuarão sujeitados ao IBS estadual e a CBS federal.

Todos os demais serviços listados desde os Decretos Lei 406 e 834, como sendo de competência municipal, (alíquotas de 2% a 5%) passarão a ser tributadas pelo IBS/CBS, em prol da União e Estados e seus municípios. É a proposta indicada na reforma tributária, cujo objetivo, longe de simplificar, é aumentar a arrecadação federal em desfavor dos estados membros e dos municípios neles situados.

É evidentíssimo que o setor de serviços, cerca de 71% do PIB nacional, ao sair do patamar de 5% no máximo para 25% de tributação implicará num brutal aumento da carga tributária, superando em cerca de 10% o conjunto ICMS-ISS, e cuja carga é claramente menor, sem mencionar que a lista do ISS dos municípios afastava a incidência do ICMS (separação de competências tributárias entre estados e municípios) ... Ora essa, os prestadores de serviços nunca pagaram o ICMS, apenas o ISS. São os grandes sacrificados, passarão a pagar novo imposto. Sobre bens e serviços na mesma altura.

No mais a reforma é anti-federativa e praticamente acaba com a autonomia municipal, jamais se viu coisa igual... O que me causa profunda estranheza é a pressa com que a Câmara dos Deputados aprovou o projeto. E maior estranheza causa a pouca oitiva que foi dada pela imprensa nacional aos especialistas. Conivência? Superficialidades? Perguntas desfocadas? De nossa parte estamos caindo numa descomunal armadilha que implicará numa alta generalizada de preços, quando a economia completa crescimento de 2.2% ao ano.

Para cumprir o prometido no início do artigo, já sabemos que o ISS hoje de 2% a 5% irá para 25%. Junto com o ICMS que também é não

cumulativo, com alíquota de 18% menos o valor do ICMS da operação anterior sobre o valor da mercadoria. (Se o contribuinte comprar por cem reais e vender por duzentos pagará 18% sobre 200 = a 36 e abaterá 18% sobre cem reais = 18, devendo pagar 36-18). No novo regime os 18% viram 25%. Eureka! Os prestadores de serviços que nunca pagaram o ICMS, passam a pagar o imposto sobre bens e serviços (misturaram ICMS e ISS) ...

Está na cara que os preços relativos da economia aumentarão. Dois setores terão redução de 60%  quais sejam bancos e instituições financeiras e transporte de pessoas e cargas. É de se concluir que a CNI, CNT e Febraban está no comando. A imprensa nacional, escrita e falada, tem tratado o tema en passant.

Bancos, transportadores e industriais com extrema facilidade repassarão os aumentos na carga tributária. O comércio — que é serviço — nem tanto. Quem provavelmente não terá condições de repassar o aumento serão os prestadores de serviços, aí incluídos os contabilistas, escritórios de advocacia, médicos, arquitetos, engenheiros, encanadores e lista vasta de profissionais...

É de ver, portanto, que se o ICMS ou IVA e os serviços sobem para 27% sobre suas operações e prestações, haverá matematicamente aumento, mormente no setor majoritário dos serviços, a começar por comerciantes e profissionais liberais. (ICMS e ISS = IVA) É, dizem de lá, mas nós acabamos com PIS, COFINS, IPI (restrito a indústria e com alíquotas baixas). Somando tudo e feitas as contas não chega a 3,8% de alívio. A tributação dos prestadores irá subir 25% na mediana, com IR e INSS considerados.

Mas não é só, a partir de agosto virão os aumentos do imposto de renda e da contribuição sobre o lucro líquido. Vivemos tempos frenéticos, porém devidamente cobertos de névoas. Nunca vi os contribuintes tão ingênuos. Entrarão em vigor pouco a pouco, ano a ano (experimentação e insegurança jurídica).

Sacha Calmon, advogado

 

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