O governo federal se apressou em comemorar os primeiros resultados do Programa Desenrola Brasil, lançado em 17 de julho. Apenas nos primeiros cinco dias, o programa limpou o nome de 2 milhões de brasileiros que estavam negativados por dívidas de até R$ 100 e permitiu a renegociação dos débitos que totalizaram R$ 500 milhões, em 150 mil contratos. A comemoração tem motivo, uma vez que o programa cumpre uma promessa de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Dividido por faixas de renda, a negociação começou pelas dívidas do sistema financeiro, com a adesão dos bancos, e se estende às redes de varejo, que se anteciparam e já oferecem ao consumidor a opção de repactuar os débitos.
O programa era mais do que necessário diante do quadro de endividamento crônico do brasileiro nos últimos meses, com o percentual de famílias com dívidas a vencer chegando a 78,5% em junho, sendo que, desse total, 18,5% se consideram muito endividados, e outros 29% têm dívidas em atraso, conforme dados da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Ao atender a uma necessidade urgente diante desse quadro de sufoco financeiro das famílias, o governo busca retomar a condição de adimplência desses consumidores para que eles voltem a consumir, o que se confirma com a intenção de lançar um programa de redução de preços de eletrodomésticos, com incentivos, para estimular o consumo e a produção industrial.
Mais uma vez, o presidente Lula adota medidas emergenciais sem a preocupação — pelo menos imediata — de contribuir para a solução de problemas estruturais. O governo perde a oportunidade de condicionar a renegociação de dívidas à educação financeira, para que os consumidores que, agora, estão conseguindo aliviar o endividamento não voltem a se endividar e a acumular débitos que ultrapassem a capacidade de pagamento. Esse risco existe, diante do prazo oferecido pelos bancos e as taxas de juros. Um consumidor que renegociar uma dívida acima de R$ 4 mil, mesmo com desconto de 50% na negociação inicial, chegará ao fim do contrato pagando mais do que a dívida inicial.
É preciso lembrar que a educação financeira é adotada hoje na grade curricular de apenas algumas escolas e uma parte delas se queixa de dificuldades para se adaptar à nova disciplina. Aqui é preciso fazer uma reflexão: o consumidor atende ao mercado. À medida que ele se educa financeiramente ele adquire mais um aspecto de cidadania, ao adquirir capacidade de lidar com suas finanças de forma consciente e sustentável. É preciso que o governo invista na educação financeira em todo o ensino brasileiro, com capacitação e preparação de professores para transmitir aos alunos os conceitos e conhecimentos que lhes permitirão trocar o imediatismo consumista pelo planejamento.
Hoje, a educação financeira está fixada em lei, com o estabelecimento da Estratégia Nacional de Educação Financeira, instituída pelo Decreto nº 7.397 do governo federal de dezembro de 2010. O objetivo é exatamente promover a educação financeira e previdenciária para fortalecer a cidadania dos brasileiros. Colocar em prática essa estratégia é urgente para que jovens brasileiros não cheguem à fase adulta integrando o contingente de endividados e sem noções de como lidar de forma adequada com o dinheiro. O governo precisa ir além de simplesmente renegociar dívidas de consumidores para que estes voltem a consumir.
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