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Saúde

A pandemia tabágica: da fumaça por filtro ao eletrônico

Em 2003, surgiu uma nova tendência no mercado do tabaco com os dispositivos eletrônicos para fumar, que têm sua primeira patente registrada em 1963

Homem fazendo uso de tabaco  -  (crédito: Getty Images)
Homem fazendo uso de tabaco - (crédito: Getty Images)
LEOPOLDO LUIZ DOS SANTOS NETO
postado em 11/07/2023 06:00

A introdução do filtro no cigarro, visando à proteção dos fumantes, foi resultado de um grande esforço publicitário. Desde os anos 1920, a marca Marlboro era comercializada como um cigarro suave, direcionado principalmente ao público feminino. No entanto, na década de 1950, em resposta às crescentes preocupações com a saúde relacionadas ao tabagismo, houve um aumento na oferta de cigarros com filtro. Isso levou a Philip Morris a reposicionar a marca Marlboro no mercado dos filtros, buscando conquistar a confiança dos consumidores.

Em 1954, a marca Marlboro passou por uma completa mudança de identidade. O novo mascote da marca, conhecido como o homem Marlboro, transmitia virilidade e rusticidade, com o objetivo de posicionar a Marlboro como um cigarro com filtro e sabor. Essa estratégia foi desenvolvida para atrair um novo público e reforçar a percepção de que o cigarro com filtro era uma opção mais segura. É importante notar que o público jovem sempre foi o principal alvo na venda de produtos relacionados ao tabaco.

Em 2003, surgiu uma nova tendência no mercado do tabaco com os dispositivos eletrônicos para fumar, que têm sua primeira patente registrada em 1963. Conhecidos por diversos termos, como cigarros eletrônicos, vapers, pods, e-cigarettes, e-ciggy, e-pipes, e-cigars, tabaco aquecido, esses dispositivos trouxeram uma verdadeira revolução ao setor.

Até o momento, o Brasil tem apresentado um bom desempenho nessa questão. O professor Paulo Lotufo afirmou que "a redução das taxas de prevalência do tabagismo no período de 1980 a 2010 foi mais rápida no Brasil (-34%) do que a média de declínio nos outros países (-28%)". Recentemente, evidências sugerem que essa estratégia de marketing tem contribuído para a adoção dos cigarros eletrônicos pelos consumidores, resultando em um aumento no seu uso em todo o mundo.

Atualmente, estamos diante de um dilema em relação à liberação dos cigarros eletrônicos. Embora esses dispositivos sejam amplamente promovidos como um avanço no controle do vício e na redução das doenças associadas ao tabagismo, a falta de embasamento em estudos científicos sólidos para respaldar sua liberação tem gerado um intenso debate na sociedade sobre os riscos e benefícios envolvidos.

A indústria do tabaco promove os dispositivos eletrônicos para fumar como alternativas menos prejudiciais aos cigarros convencionais. Esses dispositivos aquecem o tabaco a temperaturas mais baixas, visando diminuir a quantidade de substâncias químicas nocivas emitidas durante o consumo. Acredita-se que essa redução possa diminuir os riscos de danos e doenças, como o câncer de pulmão.

Segundo especialistas, a ideia de que os dispositivos eletrônicos para fumar são menos prejudiciais baseia-se na redução das substâncias químicas nocivas presentes na fumaça do tabaco. Ao aquecer o tabaco a temperaturas mais baixas do que a combustão dos cigarros tradicionais, os dispositivos produzem uma fumaça com menos compostos tóxicos e carcinogênicos. Isso teoricamente reduziria os riscos de doenças associadas ao consumo de tabaco, como o câncer de pulmão.

No entanto, embora os fabricantes estejam comercializando os dispositivos eletrônicos como alternativas mais seguras, especialistas em saúde têm preocupações em relação aos possíveis efeitos a longo prazo desses produtos. Apesar da redução nas substâncias químicas emitidas, os cigarros eletrônicos ainda contêm nicotina, uma substância viciante, e outros componentes que podem ter impactos negativos na saúde pulmonar.

Pontos para reflexão: em 2020, pesquisadores do Instituto Nacional do Câncer (Laura Barufaldi e colaboradores) alertaram para o maior risco de iniciação ao tabagismo associado ao uso de cigarros eletrônicos. Recentemente, pesquisadores do Instituto do Coração do HCFMUSP-SP (grupo da dra. Jaqueline Scholz) identificaram níveis alarmantes de nicotina, equivalentes a 20 cigarros por dia, em fumantes de cigarros eletrônicos.

Para uma avaliação mais abrangente dos riscos e benefícios dos cigarros eletrônicos, são necessárias mais pesquisas científicas. Enquanto isso, autoridades de saúde e órgãos regulatórios estão acompanhando de perto essa questão e trabalhando para tomar decisões informadas que protejam a saúde pública.

É responsabilidade de todos nós controlar todas as formas de tabagismo, seja por meio do uso de filtros, cigarros eletrônicos ou outras estratégias pseudocientíficas propagandísticas. Afinal, o tabagismo ainda é responsável por 5 milhões de óbitos por ano.

LEOPOLDO LUIZ DOS SANTOS NETO,  médico, docente do Programa de Pós-Graduação em Ciências Médicas da UnB

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