A retomada do crescimento da economia brasileira está diretamente ligada à maior inserção do país nos mercados internacionais e à melhoria da competitividade de sua indústria. As exportações têm um papel central nesse processo ao expor as empresas brasileiras à acirrada competição global e impulsionar a inovação.
Entre as políticas públicas de apoio às exportações, ganharam destaque, nas últimas décadas, os sistemas oficiais de financiamento e garantias de crédito às vendas externas. Hoje, esses instrumentos estão presentes em mais de 110 países e configuram componente central nas estratégias de exportação de setores em que, por características do produto — valor unitário, prazos de produção etc. — a regra é o financiamento de longo prazo. São casos em que se observa uma inequívoca falha de mercado.
No Brasil, programas estabelecidos há décadas como o Proex-Equalização, o Seguro de Crédito às Exportações (SCE) do Fundo de Garantia às Exportações (FGE) e o BNDES exercem papel fundamental na alavancagem internacional do setor aeronáutico, promovendo a entrada de divisas e a geração de emprego e renda no país.
A relevância do financiamento público como instrumento de promoção de exportações levou alguns países a usá-lo como forma de subsidiar suas indústrias, gerando distorções na concorrência internacional. Para lidar com o problema, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) elaborou um instrumento normativo, o Arrangement on Officially Supported Export Credits (OECD Arrangement) com o objetivo de equilibrar a competição no mercado internacional.
No caso do setor aeroespacial em especial, essas questões revelaram-se particularmente sensíveis e foram alvo de controvérsias no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC), envolvendo Brasil, Canadá, EUA e União Europeia. As discussões criaram ambiente favorável à negociação de um Entendimento Setorial Anexo ao Arrangement da OCDE (o ASU — Aircraft Sector Understanding), em cuja concepção o Brasil desempenhou papel muito relevante. Embora esses instrumentos normativos tenham contribuído para equilibrar as condições de competição, evoluções em duas dimensões vêm comprometendo muito a competitividade dos instrumentos brasileiros de financiamento público às exportações.
Por um lado, o sistema de crédito à exportação tem ganhado mais robustez e sofisticação nas principais economias do mundo, em alguns casos assumindo características que o colocam fora das regras previstas no Arrangement. Uma parcela significativa do apoio governamental às exportações instrumentaliza-se por meio de operações de garantias de crédito, sem limitações de volumes e concentração de risco, com uma estruturação normalmente rápida e pouco burocrática.
O Brasil, por sua vez, tem demonstrado dificuldades para acompanhar essa evolução global. O BNDES tem desempenhado um extraordinário papel, porém, considerando o sistema como um todo, observa-se pouca diversidade na operação de linhas de financiamento, a ausência da concessão de garantias (apenas seguro de crédito), além de vulnerabilidades no sistema público de financiamento e seguro de crédito à exportação, marcado pela restrição de recursos orçamentários, insegurança jurídica relacionada aos órgãos de controle e por problemas de governança. É preciso reverter esse cenário.
Como defende a CNI, é fundamental "alinhar o sistema brasileiro às melhores práticas internacionais. Isso contribuirá para o aumento da competitividade de bens e serviços nacionais em mercados internacionais". Superar as carências e a instabilidade de recursos financeiros, a baixa coordenação entre instituições do sistema de apoio às exportações e as incertezas orçamentárias e a insegurança jurídica são requisitos para alcançar esse objetivo.
Entendemos que o sistema brasileiro de crédito à exportação passará por ampla revisão, o que, na visão da indústria aeroespacial brasileira, constitui uma oportunidade única para que os problemas apontados sejam adequadamente tratados. O desafio é equacionar os pontos de aprimoramento já sabidos e implementar a transição para um novo modelo, sem rupturas ou interrupções que fragilizem o fluxo comercial. Na nossa visão, é essa uma das principais formas de reposicionar a indústria brasileira no mesmo patamar de competição internacional que seus concorrentes.
Julio Shidara - Presidente da Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil (Aiab).