JUSTIÇA

Artigo: O STF e a segurança jurídica

Para garantir um ambiente de negócios seguro, o Supremo Tribunal Federal (STF) ratificou no início deste ano a licitude da terceirização da atividade-fim e a legalidade de outras formas de organização do trabalho

O Poder Judiciário é peça-chave na tomada de decisões de agentes econômicos. Quando os tribunais superiores decidem determinada matéria, definem o rumo dos investimentos na economia. Para garantir um ambiente de negócios seguro, o Supremo Tribunal Federal (STF) ratificou no início deste ano a licitude da terceirização da atividade-fim e a legalidade de outras formas de organização do trabalho. Nessa esteira, em diversos casos concretos subsequentes, o STF reforçou o entendimento de que deve prevalecer a livre manifestação de vontade das partes, como prescreve a recente Lei de Liberdade Econômica.

Isso ocorre porque, com preocupante frequência, a Justiça do Trabalho demonstra que possui entendimento diverso e julga, sob ótica por vezes parcial, temas de cunho eminentemente empresariais. São decisões que desconsideram aspectos de determinadas relações privadas comerciais e anulam arranjos firmados por agentes amplamente capacitados para negociar e se beneficiar mutuamente dos termos dessa relação.

Com efeito, em março de 2023, foi a vez do segmento de franquias ter o modelo jurídico-contratual protegido pelo STF. Trata-se de setor estratégico que promove o empreendedorismo e gera tributos aos entes federativos. As franquias são uma opção de investimento viável e seguro, no qual o empresário reduz o risco e a incerteza, já que adquire o know how, autorização para uso de marca consolidada e atua com produtos ou serviços conhecidos no mercado.

Vale lembrar que, em 2020, a nova Lei de Franquia (nº 13.966) ratificou alguns conceitos e aperfeiçoou outros para tornar a relação entre franqueadora e franquias ainda mais seguro e transparente. Logo no 1º artigo da lei, o Legislativo optou por fazer constar que o contrato de franquia não caracteriza vínculo empregatício entre franqueadoras e franqueados (tampouco relação de consumo) — algo que já era previsto desde 1994, e foi propositalmente reiterado na nova lei.

Mesmo assim, alguns pronunciamentos judiciais do trabalho seguem reconhecendo vínculo de emprego em contratos de franquia firmados entre empresários. Diante disso, duas Reclamações Constitucionais (RCL) — mecanismo judicial para restabelecer a autoridade de precedentes do Supremo — foram apresentadas por distintas franqueadoras, reclamando o indevido reconhecimento de relação empregatícia.

Na primeira, o ministro Alexandre de Moraes cassou decisão que reconheceu vínculo de emprego em relação de franquia entre empresa de odontologia e uma cirurgiã dentista. O relator mencionou jurisprudência e destacou que o TRT-RJ "não observou o entendimento da Corte quanto à constitucionalidade das relações de trabalho diversas da de emprego regida pela CLT".

Posteriormente, uma liminar do ministro André Mendonça suspendeu processo que envolvia uma franquia da Prudential do Brasil, autora da RCL. A cautelar foi confirmada por unanimidade pela 2ª Turma do STF. O relator mencionou outros precedentes e afirmou que a decisão do TRT-SP ignorou o funcionamento "[d]o mercado de venda de seguros e a função social do contrato de franquia na dinâmica organizacional tanto do franqueado como do franqueador".

Na mesma direção, em abril e em junho, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) reformou acórdãos, consecutivamente, do TRT-9 e do TRT-10 que haviam reconhecido vínculo de emprego entre franqueadora e franqueados. Para o ministro relator Alexandre Ramos, "em se tratando de discussão jurídica já pacificada por tese firmada pelo STF em repercussão geral reconhecida, cabe às demais instâncias do Poder Judiciário tão somente aplicá-la nos casos concretos a fim de conferir efetividade ao julgamento da Suprema Corte".

Essas decisões devem conduzir à análise de outros casos de mesma natureza em todas as instâncias no âmbito trabalhista, sob pena de gerarem novas demandas para o STF e o TST, diante do desacato às cortes superiores, e de promover insegurança jurídica no setor de franquias, retraindo novos investimentos privados.

Espera-se que a forma como foi pacificada essa matéria pelo Judiciário, celebrando e respeitando o que foi contratado em relações de franquia, se espraie rapidamente entre as diferentes jurisdições. É o que garantirá um ambiente de negócios saudável para fomentar o desenvolvimento desse importante setor empresarial.

ANTONIO REZENDE, vice-presidente Jurídico, de Relações Institucionais e Proteção de dados pessoais da Prudential do Brasil

PEDRO MANSUR, diretor Jurídico da Prudential do Brasil

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