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Artigo: Oscar Niemeyer, linhas e luzes

A mostra reúnde as obras de Oscar mundo afora: Paris e Niterói, Itália e São Paulo, em todos os lugares onde o mestre plantou sua genialidade

Brasília sempre nos surpreende. De passagem pelo ParkShopping com as minhas filhas, fui ver a exposição Oscar Niemeyer: Linhas e Luzes, que fica aberta até 22 de junho. Genial, oportuna e merece ser visitada. A mostra está dividida em três blocos. No primeiro, apresenta a primeira fase de Oscar Niemeyer, ainda jovem, trabalhando com Lucio Costa e Le Corbusier, no prédio do Ministério da Educação, no Rio de Janeiro, que inventou o tal de pilotis, que nada mais é do que um conjunto de colunas que sustentam uma obra e deixam o prédio mais leve, com um pavimento térreo livre para ser usado como área de convivência, passagem e até salão de festas.

O próprio Lucio Costa me contou, certa vez, ter sido escolhido para trabalhar com Le Corbusier naquele projeto pela simples razão de ter morado na França e dominar bem o francês. Modéstia dele. Lucio já era um arquiteto conceituado na época. E tinha como estagiário um aluno da Escola de Belas Artes, Oscar Niemeyer. Lucio e Oscar foram, em 1936, ao Campo dos Afonsos, no Rio, receber Le Corbusier, que chegava de dirigível, o famoso Zepelin. Ficaram amigos. E com o prédio do MEC, hoje Palácio Capanema, iniciaram uma revolução na arquitetura brasileira.

A mostra do ParkShopping traz também o monumental projeto de Oscar para a sede da ONU, em Nova York. O projeto de Oscar foi o vencedor do concurso e ele, generosamente, aceitou sugestões de Le Corbusier e sua parceria.

Outra lembrança importante na exposição é o Conjunto Cultural da Pampulha, projetado por Oscar Niemeyer a convite do então prefeito de Belo Horizonte, Juscelino Kubitschek. Desse projeto participaram Burle Marx, Cândido Portinari e Athos Bulcão.

No complexo da Pampulha, destaca-se a igrejinha São Francisco, com suas curvas geniais, diferente de qualquer outra igreja no mundo. Traz o maravilhoso painel de azulejos de Cândido Portinari. A Pampulha, hoje tombada como Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco, tanto na política como na arquitetura, acabou sendo o embrião de Brasília.

No segundo bloco, a exposição nos lembra a genial arquitetura de Oscar para Brasília, reinventando, com suas curvas sensuais, o conceito de cidade. Únicos são os vãos livres do Itamaraty, as colunas do Palácio do Alvorada e a Catedral, graças a outro gênio parceiro de Oscar: o engenheiro, calculista e poeta Joaquim Cardozo.

As colunas do Alvorada passaram a ser a marca da cidade que nascia, moderna, ousada, com apenas um ponto de contato no solo e outro no teto. Um grande desafio para o concreto armado. E tem ainda o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o Palácio da Justiça da mais bela arquitetura moderna.

No último bloco, estão as obras de Oscar mundo afora: Paris e Niterói, Itália e São Paulo, em todos os lugares onde o mestre plantou sua genialidade. A exposição ainda tem uma interação interessante. Com fones à disposição, pode-se ouvir a voz de Oscar Niemeyer explicando seus conceitos de vida, respondendo a perguntas e dando explicações sobre cada projeto.

Oscar era um humanista. Preocupava-se com as desigualdades e as injustiças sociais, o que o levaram a ser amigo de Luís Carlos Prestes e participar com Jorge Amado da fundação do Partido Comunista.

Temos o privilégio de viver numa cidade-arte a céu aberto. Por vezes, não nos damos conta da importância, da beleza e da modernidade que está diariamente sensibilizando nossos olhos e nosso coração. Brasília reinventou o conceito de cidade, trocou ruas por eixos, quarteirões por superquadras, esquinas por tesourinhas e fez a arquitetura e o urbanismo brasileiro serem admirados no mundo inteiro.

A exposição nos faz lembrar os Anos Dourados do Brasil. A melhor fase da nossa história, quando os gênios de todas as áreas se encontraram, liderados pelo otimismo de JK. Tempos de Lucio Costa e Oscar Niemeyer, Burle Marx, Bruno Giorgio, Ceschiatti, Portinari, Marianne Peretti e Athos Bulcão. De Vinicius de Moraes e Tom Jobim, que, hospedados no Catetinho, fizeram a genial "Sinfonia da Alvorada": "No princípio era o ermo, uma imensa solidão sem mágoa..."

Tempo de Pelé e Garrincha, de Éder Jofre e Maria Ester Bueno, de Nelson Pereira dos Santos e Glauber Rocha. Tempo, segundo Cacá Diegues, que a gente tinha que correr atrás do Brasil para não ficar pra trás. Como bem definiu Nelson Rodrigues, tempo que o país perdeu o conceito de vira-lata e passou a acreditar no seu enorme potencial natural e humano.

Só faltou, na exposição, o último projeto de Oscar inaugurado com o mestre ainda vivo: a Torre de TV Digital, que construímos quando ele já tinha 102 anos bem vividos.

Gostaria muito de ver essa exposição não apenas no ParkShopping, um lugar de certa forma elitizado, mas correndo as cidades satélites e as escolas para que todos os brasilienses pudessem sentir o orgulho de conhecer a história de um Brasil vencedor.

*JOSÉ ROBERTO ARRUDA - Ex-governador do Distrito Federal

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