Assim caminha a humanidade foi um filme de época que fez sucesso pela trama, pelas imagens e pelos atores que estiveram à frente do desenrolar do bem elaborado roteiro e demais características da película. Na época, meados dos anos 1950, o mundo buscava reservas de petróleo e, no filme, uma escavação fez jorrar petróleo onde só se pensava em gado, grandes rebanhos na vasta planície. É um filme de longa duração e também um dos clássicos da cinematografia.
Mas o que se perdeu no caminho dessa película? Talvez o que ficou esquecido tenha sido o começo do macartismo, ou descobrir onde estavam os comunistas na América, coisa que nunca vicejou no país que preza a democracia, nem prosperaria porque todos prezam sua liberdade e fogem do nivelamento socialista. Também não pensam nas durezas que os comunistas, na época da União Soviética, enfrentavam e por isso se construiu a assim denominada Cortina de Ferro. Essa separava os países democráticos do Ocidente dos que ficavam no Oriente da dividida Berlim.
Pude visitar uma pequena parte da Berlim oriental, onde se tratavam bem os turistas, inclusive oferecendo-lhes caviar e champanhe, coisa vetada para a população local, que sofria muitas carências pelo que se ouviu falar no ônibus de turismo (era um veículo de dois andares: na parte superior, os militares americanos, uniformizados, curiosos, mas sem armas). Os turistas eram obrigados a deixar os dólares "Check Point Charlie ou outros pontos, antes de ir a Berlim oriental, o que denotava desconfiança de que o dinheiro fosse deixado para pessoas do outro lado. Todavia, não se notava nos militares orientais nenhuma tensão, tanto que ofereciam um desfile dos militares no lado oriental com seu tradicional "passo de ganso", uma marcha que deveriam exigir forte compleição física de pernas e braços dos integrantes da tropa, uma lembrança perene na memória.
Mas essa descrição, que pode conter imperfeições pelo decurso do prazo dos acontecimentos de cerca de quase 60 anos e pelo seu caráter geopolítico que impressionava qualquer viajante ocidental à época do anticomunismo vigente no Ocidente e também pela tristeza de ver populações reprimidas no Oriente. Neste, boa parte das liberdades foram suprimidas e também na educação das novas gerações, pois as guerras acabam com o fluxo natural da educação das crianças e jovens.
Aí,pode-se perfeitamente avaliar muitas questões do que se perdeu. Uma das coisas perdidas foi a das preciosas vidas humanas, de soldados e de civis, em função do conflito. Igualmente, o desgaste de tempo perdido como em todos os eventos armados ou belicosos e das liberdades democráticas evaporadas, ao menos na visão do presente ocidental. Avalia-se também o tempo perdido com a divisão ideológica entre seres humanos com iguais necessidades materiais e espirituais e, logicamente, de equipamento necessário ao bem-estar das pessoas em todos os quadrantes do planeta, mesmo sendo esse um ponto pequeno no cosmo, como nos relata o astrônomo americano Carl Sagan.
De fato, é na imensidão do universo conhecido até o presente que se materializam os eventos, extremamente significantes e desafiadores. Nas pessoas do Oriente submetidos a rígidas normas de segurança e no Ocidente a
visão de que algo precisaria mudar para evitar um conflito armado, pois, terminada a Segunda Grande Guerra, os povos não queriam e não querem que outras batalhas ocorram. O pensamento geral é o de que não se ouça mais o ruído de canhões, mísseis e bombas destruidoras de vidas humanas e não humanas. Idealiza-se igualmente que sejam mantidos em perfeitas condições de uso os equipamentos construídos durante séculos, nas indústrias e nas comunicações, inclusive na mobilidade de pessoas e ideias.
Portanto, o mundo mudou e as ideologias para o confronto bélico foram deixadas para trás. Essa é uma aspiração dos países de um bloco pacífico a ser construído. Então, teremos uma desejada calmaria, que os conflitos armados se percam na poeira do tempo. Em séculos vindouros, a confraternização universal terá seguimento duradouro. Os belicistas ou expansionistas não terão assento nesse bloco porque a maioria decidirá a favor da cessação do fabrico de armamentos e a atividade lucrativa com a venda de aparatos bélicos, na terra, no ar e no mar.
O mundo será lugar melhor e do planeta Terra brotarão as sementes da harmonia e do congraçamento universal. As crianças já crescerão conhecendo esses propósitos repassados pelos avós, pais e pela escola no rumo do cultivo do verde da esperança e de todas as cores do bem-estar dos povos. Essa é a aspiração de que nada se perca num mundo mais humano, seguro e mais habitável para todos.
ALDO PAVIANI - Geógrafo, professor emérito da Universidade de Brasília, membro do Instituto Histórico Geográfico do DF, do Núcleo do Futuro da UnB e da Associação Nacional de Escritores (ANE).
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