Dois episódios ocorridos na última semana guardam relação direta com Brasília, capital federal e centro das decisões políticas nacionais. O primeiro é o lamentável represamento do Fundo Constitucional do Distrito Federal, instrumento definido por lei, há mais de 20 anos, que assegura, conforme determina a Carta Magna, a manutenção e a organização das áreas de Segurança, Saúde e Educação no quadrilátero que hospeda os Três Poderes.
O segundo fato é a instalação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito sobre os atos de 8 de janeiro, página criminosa da história nacional, fruto de uma inaceitável trama golpista urdida no coração da República.
A tesourada no Fundo Constitucional do DF foi instituída com a aprovação do marco fiscal pela Câmara dos Deputados, sob a alegação de que era preciso enquadrá-lo no limite de despesas que o governo federal pretende seguir nos próximos anos. A mesma lógica se aplicou ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), verba historicamente penalizada pela obsessão de sequestrar investimentos destinados a políticas públicas de grande alcance para atender a interesses mesquinhos.
Ao impor uma trava nos recursos reservados para a sustentação do Distrito Federal, os congressistas e o governo de Luiz Inácio Lula da Silva cometem dois erros crassos. Em primeiro lugar, colocam em risco a estabilidade do centro político do país. Brasília não é apenas a capital da República. É uma instituição. Reúne o arcabouço institucional que sustenta o regime democrático.
Por esse motivo, está impedida de abrigar atividades econômicas de grande porte, como indústrias de bens de consumo ou agroexportação em larga escala. É uma cidade que tem a responsabilidade de oferecer um ambiente propício para o funcionamento das instituições federais — e isso inclui não apenas a segurança pública, mas os serviços de saúde e de educação.
O segundo equívoco: impor restrições orçamentárias à viabilidade de Brasília é trabalhar contra o projeto nacional que marca a história do país. Desde os tempos coloniais, registrava-se a preocupação de se construir uma capital no interior do Brasil, de modo a não deixá-lo tão vulnerável à cobiça de potências europeias e de corsários que atacavam a costa do Rio de Janeiro e de Pernambuco, só para citar alguns exemplos.
Foi a determinação de grandes brasileiros, como José Bonifácio e Juscelino Kubitschek, que permitiu concretizar o projeto de interiorização do Brasil, conferindo unidade política e potencial econômico à nação. É esse plano histórico, elaborado há séculos, que está sendo sabotado por movimentações irresponsáveis no Congresso Nacional.
A instalação da CPMI de 8 de janeiro, por outras razões, também reforça a necessidade de se preservar o coração da República. Punam-se os responsáveis pelos atos de terrorismo, em nome da democracia. E que se reafirme, para a posteridade, que Brasília é patrimônio de todos os brasileiros, devendo, portanto, ser protegida do alvedrio de quem nutre paixões imediatistas, paroquiais e antirrepublicanas.