É muito comum políticos olharem Brasília como cartão-postal. Do alto dos seus gabinetes ou através das películas dos carros, vislumbram a capital dos monumentos e dos privilégios, os seus sobretudo. Poucos veem as pessoas, as mazelas, as favelas, as dificuldades crescentes de uma capital que se estendeu além do plano. Talvez desconheçam que aqui habita gente, e não só político turista.
Ao dar uma facada no Fundo Constitucional do DF, o deputado baiano Cláudio Cajado (PP) e os outros 371 congressistas desferiram um duro golpe contra a população de Brasília.
O jabuti incluído no projeto do arcabouço fiscal pode legar uma perda de R$ 87 bilhões ao DF até 2033, segundo dados do GDF. Prejuízo que afeta em cheio as áreas de segurança, esta custeada integralmente pelo Fundo, e de educação e saúde, que também dependem de repasses do governo federal. Concursos, reajustes, reequipação de forças de segurança, projetos sociais, investimentos e muitas outras ações serão suspensas ou receberão grandes cortes.
Há quem diga — e eu não custo a acreditar — que os ataques de 8 de janeiro ajudaram a colocar Brasília para ferver no caldeirão da vingança.
Na ocasião, escrevi aqui neste espaço que Brasília, por ser capital e sede dos Poderes, não podia pagar aquela conta sozinha, sobretudo com ameaças à sua autonomia econômica e política. A intervenção na área de segurança acabou, mas o trauma do que vivemos aqui não se dissolveu. Não bastassem a barbárie e a destruição do patrimônio, agora temos de conviver com a punição financeira.
O deputado Cajado não deu ouvidos aos políticos brasilienses que se uniram com o propósito de defender o Fundo tal como ele é. O GDF, até o momento, se mostrou pouco hábil para provar que a mudança proposta vai atingir em cheio projetos prioritários, apesar de ter enviado um relatório explicando os impactos. Tentou explicar, mas não convenceu.
Se não fortalecer o discurso, buscar novos argumentos e bases jurídicas, Ibaneis vai deixar o governo legando ao próximo chefe do Executivo local a condição de pedinte, numa situação muito mais crítica do que a que se vive hoje. Também será péssimo para o resto do seu mandato e o da vice Celina Leão, que é do mesmo partido de Cajado, o mais novo candidato a carrasco da capital.
O projeto, que diminui pela metade o crescimento percentual médio que o Fundo teve nos últimos 21 anos, ainda passará pelo Senado, mas com a pressa do governo federal na aprovação, Brasília não será agenda prioritária, o que torna bem difícil a exclusão do "presente" de Cajado para a capital federal.
A verdade é que o Fundo Constitucional do DF é daquelas conquistas que despertam inveja. Sempre foi assim. Brasília precisa ser eternamente vigilante para não perdê-la. Deveria ser o oposto. Reconhecer a importância da capital, proteger o patrimônio e resguardar os direitos da população do DF é também função dos políticos que aqui exercem seus mandatos.