Força Terrestre

Artigo: Brasil, destino como potência

Otávio Rêgo Barros - General de Reserva, foi chefe do Centro de Comunicação Social do Exército

O Centro de Estudos Estratégicos do Exército (Ceeex), think tank ligado ao Estado-Maior da Força Terrestre, reuniu-se pela primeira vez neste ano com os pesquisadores externos contratados pelo órgão. Esses profissionais foram selecionados com base em suas produções acadêmicas, com a finalidade de elaborar artigos a serem publicados ao longo do ano, na revista científica Análise Estratégica. Os trabalhos desenvolvidos por esses colaboradores do Núcleo de Estudos Prospectivos (NEP) devem indicar caminhos a serem trilhados pela Força Terrestre e têm sua projeção temporal alinhada com o sistema de planejamento do Exército (Siplex).

Como resultado final, entregarão policy papers que servirão como balizas às decisões do Alto-Comando do Exército, antecipando os desafios a serem enfrentados no caminho do cenário prospectivo 2040.

Para o ano de 2023, selecionaram-se quatro temas considerados de interesse da Força: reordenamento internacional e geopolítica na América do Sul; mudanças climáticas, segurança nacional e emprego militar; estratégia e política de defesa - base para um planejamento estratégico; e, finalmente, o ambiente informacional e a guerra do futuro. Encadeados, o Ceeex identificou que, a partir de um planejamento militar de alto nível, deveria centrar o foco dos estudos no subcontinente sul-americano, especialmente na questão ambiental, alvo de interesse mundial.

Justaposto a esse escalonamento, valorizou-se a análise do ambiente informacional, teatro de operações futuro ainda não completamente escrutinado por nossas Forças Armadas.

Acima dessa pirâmide, sente-se falta de uma grande estratégia de Estado que balize os campos do poder, colimando-os para os interesses da nação brasileira. É documento político comum nos países mais avançados. Estamos atrasados.

A cada dia, os desafios para proteção da segurança nacional, envolvendo o território, e da segurança humana, envolvendo a gente, ganham contornos mais contundentes, o que nos obriga como Estado organizado a pensar pragmaticamente em como desenvolver nossas defesas.

É compreensível que outros desafios mais urgentes identificados na construção de um Brasil equilibrado socialmente recebam prioridade na partição do bolo orçamentário.

Todavia, de nada valerá essa preocupação legítima se os ganhos dela advindos não puderem ser usufruídos por nosso povo em caso de atores externos (e até internos) ambicionarem e intentarem tomá-los na "mão grande". Urge, pois, a partir de orientação clara do nível político-governamental mais elevado que estudemos o entorno geográfico de nosso país, os acordos firmados, os apoios prometidos e arranjos para estabilidade da região.

A América do Sul parece se oferecer como palco privilegiado para competições entre as grandes potências. Os contenciosos já estão na arena. Desconhecê-los seria amadorismo dos que estudam o tema defesa.

Estados Unidos, China, Rússia, Irã e até países da velha Europa se assanham para ganhar influência na América do Sul.

Nessas disputas, se os países latino-americanos não tiverem capacidade de dissuadir adequadamente antagonistas, tornar-se-ão apenas coadjuvantes do grande espetáculo.

Exemplos de países incapazes de se fazerem respeitados no cenário mundial, reféns de interesses exógenos, estão todos os dias nas telas dos aparelhos celulares mundo afora. Uma política clara, comunicada objetivamente para o mundo, demonstrações inequívocas do projeto diplomático, suporte bélico para assegurar e impor a compreensão, e orçamento compatível com a dimensão do país são essenciais ao sucesso da causa.

O Brasil, ainda que reconhecido no emprego do soft power em operações militares, em particular nas missões sob a égide das Nações Unidas, não pode abdicar de se apresentar como a potência regional apta a liderar, empregando postura mais assertiva, indutiva de que estará atento às disputas entre terceiros em zona de sua influência.

O Brasil, aspirante a papel relevante no contexto mundial, vai precisar correr riscos e definir uma política e uma estratégia de defesa mais agressivas, alinhadas com os desafios que se predisporá a enfrentar.

Como afirmou o pensador americano Alvin Toffler, "ou você tem uma estratégia própria, ou então é parte da estratégia de alguém". Destemido que é, o Brasil saberá construir com adequada estratégia seu destino de potência.

 


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