Fecho os olhos. Ouço o choro de homens e mulheres, amontoados em dormitórios cobertos de percevejos. Raquíticos, esfomeados, com o olhar perdido na desesperança. Posso imaginar as crianças, órfãs de pais e do mundo, abandonadas à própria sorte para tentarem a sobrevivência em um local onde a morte quase sempre vencia. Não consigo dimensionar a dor de milhões de inocentes asfixiados pelo gás Zyklon B que saía do teto. Quando pensavam que tomariam um banho quente, encontraram o fim trágico e rápido. Ah, um banho quente... Seria um luxo em tempos infernais. Depois, a pilha de corpos inertes, montanhas que um dia foram sorrisos, afeto, amor, planos. E a fumaça que subia aos céus com o cheiro de carne queimada. O horror. O destino traçado por uma ideologia assassina, cruel, perversa, nefasta, repleta de tudo o que há de pior na mente humana.
Escrevo este artigo em 8 de maio, uma segunda-feira. Há 78 anos, a Alemanha nazista era derrotada na Segunda Guerra Mundial. Quase oito décadas se passaram, e a escória do pensamento de Adolf Hitler segue viva, na forma da idolatria de alguns perturbados. É inadmissível que pretensos seres humanos cultuem o esgoto do pensamento hitlerista. Oito décadas depois de Auschwitz, Treblinka, Dachau e Sobibor, ainda há quem negue o passado e o Holocausto. Ainda quem não se envergonhe de empunhar uma bandeira com a suástica ou de fazer saudações nazistas.
Nesses anos de Correio Braziliense, pude entrevistar sobreviventes de Auschwitz. Jornalistas precisam tentar se distanciar do fato, para retratá-lo de forma isenta. Confesso que me emocionei todas as vezes em que falei com judeus que resistiram ao horror. Assim como as lágrimas rolaram ao visitar o Yad Vashem, o Museu do Holocausto, em Jerusalém. A imensa pilha de sapatos usados, os uniformes de prisioneiros de Auschwitz sujos da poeira do campo e puídos, os retratos e os pertences de quem foi arrancado da vida de maneira torpe. O memorial às crianças — um corredor totalmente escuro, um túnel em meio a velas e jogos de espelhos que lembram um céu estrelado, enquanto os nomes e as idades dos pequenos assassinados são pronunciados.
Aprender com o Holocausto é o mínimo que podemos fazer em memória de milhões de seres humanos exterminados. Aprender a rejeitar o racismo, o ódio, a opressão, a misoginia, a homofobia, a idolatria a políticos que se julgam paladinos da moral. Aprender a abominar a guerra e sua capacidade de transformar homens em monstros, seres abjetos programados para matar, estuprar, saquear. Aprender a respeitar a diversidade e a pluralidade, a entender o outro como igual, ainda que em meio a um universo de diferenças. Olhar oito décadas atrás e reverenciar a memória de quem morreu nas mãos do nazismo é, também, uma forma de impedir que atrocidades voltem a ocorrer.