NULL
Opinião

Artigo: O Fundo Constitucional é vital para o DF

Não é fragilizando um serviço que se fomenta eficiência. A manutenção do modelo de repasse para o Fundo Constitucional do DF é a garantia do nosso sustento

Amanhecer em Brasília - Memorial JK - Isto É Brasília.  -  (crédito: Ed Alves/CB)
Amanhecer em Brasília - Memorial JK - Isto É Brasília. - (crédito: Ed Alves/CB)
postado em 29/05/2023 06:00

ANDRÉ OCTAVIO KUBITSCHEK — Advogado e empresário

A aprovação da emenda do relator Cláudio Cajado (PP-BA), inserida no bojo do arcabouço fiscal, é um desastre para a nossa capital. Com total convicção, entendo que o Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF) é mais que necessário para garantir um futuro adequado aos brasilienses. Em verdade, o FCDF é vital para a capital do país. Concebida e construída em mil dias, Brasília realizou o sonho de Dom Bosco, concretizado no destemor de Juscelino Kubitschek, e passou a enfrentar seguidos desafios que se sobrepunham logo após conquistar sua autonomia político-administrativa.

O primeiro, e um dos mais significativos, foi equacionar a via-crúcis de captação de recursos para manutenção de três setores essenciais em qualquer comunidade: segurança, saúde e educação. Cidade administrativa, sem gerar suficiente arrecadação, mas com despesas adicionais altíssimas por amparar o governo federal, embaixadas e outras representações internacionais e nacionais, Brasília sempre dependeu da insegura articulação política para obter sucesso nas constantes solicitações de custeio ao Tesouro Nacional.

O Fundo Constitucional despolitizou essa prática, eliminou a incerteza e trouxe estabilidade e soberania para o Distrito Federal. E aqui faço parênteses para, além de reconhecer a eficácia do instrumento, manifestar meu orgulho por ter tido origem em projeto de meu pai, Paulo Octávio, que começou a busca dessa importante autonomia financeira da capital quando do seu mandato como deputado federal ainda nos anos 1990.

À época, já havia a tradição de a União custear as despesas de saúde, educação e segurança. Durante vários governos, esse dispêndio foi colocado em xeque inúmeras ocasiões e era preciso criar um dispositivo que garantisse que os valores fossem pagos por aqueles que usam o espaço público do DF — uma justa contrapartida pela ocupação de nossa cidade pela máquina estatal nacional.

Assim, PO teve a ideia de apresentar o Projeto de Lei Complementar 11/1999, em 17 de março daquele ano. A proposta instituía o Fundo para a Assistência Financeira do Distrito Federal (FafiDF). Durante quatro anos, tramitou pelas diversas comissões da Casa, sendo sucessivamente aprovada. No governo Fernando Henrique Cardoso, a tramitação no Senado, somada a outras iniciativas parlamentares com o mesmo objetivo, foi rápida — a essa altura, já com o nome de Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF). Protocolado em 12 de dezembro, o projeto tramitou com urgência pelo Senado e, em cinco dias, foi aprovado no plenário, seguindo para as mãos do presidente Fernando Henrique Cardoso, sendo sancionado no dia 27 de dezembro de 2002, reforçando a autonomia do cofre distrital.

Graças à Lei 10.633/02, o Fundo Constitucional do Distrito Federal provê ao GDF os recursos para organização e manutenção da Polícia Civil, PM e do Corpo de Bombeiros, além de assistência financeira para execução de serviços públicos de saúde e educação. Em seu primeiro ano, o de 2003, destinou R$ 3 bilhões ao DF e, em 2023, R$ 23 bilhões — para se ter uma ideia da importância do Fundo e da sua necessária correção de valores.

O modelo estabelecido na legislação, tecnicamente mais indicado e até hoje utilizado, calcula o valor dos repasses anuais pela variação da receita corrente líquida da União. Isso quer dizer que o FCDF tem recursos crescentes, que custeiam de forma regular os gastos com segurança, saúde e educação. Apesar de estar previsto em lei, ao longo dos anos, várias têm sido as tentativas de alterar a forma de repasse para o Fundo Constitucional do DF, sempre inserindo prejuízos financeiros para a capital de todos os brasileiros.

A mais grave, no entanto, foi a inclusão da emenda de Cajado. Com ela, enxertada no texto que trata do necessário arcabouço fiscal, o teto de reajuste do Fundo passa a ser limitado a 2,5%, mais o IPCA anual. Com isso, segundo a Secretaria de Planejamento, Orçamento e Administração do DF (Seplad-DF), nos próximos 10 anos, as projeções de variação do FCDF, pela regra imposta pelo relator, ficariam em 5,76%. A variação do Fundo, pela regra atual, registrou média de 10,71%. Assim, a projeção alerta para uma perda de R$ 87,8 bilhões até 2033, impactando indubitavelmente no orçamento do Distrito Federal.

A perda média anual desses cinco pontos percentuais nos reajustes anuais trará desastrosas consequências, com a inevitável perda de eficiência na prestação dos nossos serviços públicos. Não haverá espaço para reajuste salarial, aposentadorias serão prejudicadas e aumentos serão impossíveis. Após os lamentáveis acontecimentos de 8 de janeiro, o FCDF passou a ser alvo de convenientes questionamentos por abranger segurança pública, de tal forma que, de todas as mudanças constitucionais no novo arcabouço fiscal proposto, somente o FCDF foi incluído no texto relativo à limitação de gastos.

Não é fragilizando um serviço que se fomenta eficiência. A manutenção do modelo de repasse para o Fundo Constitucional do DF é a garantia do nosso sustento. Por isso, confio que ainda teremos dos Poderes Legislativo e Executivo o necessário veto a essa aberração, que vai prejudicar a população que precisa de qualidade nos serviços públicos de segurança, saúde e educação. Ressalto que capital é só uma. É nosso dever preservá-la.

Gostou da matéria? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:
Ícone do whatsapp
Ícone do telegram

Dê a sua opinião! O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores pelo e-mail sredat.df@dabr.com.br

-->