A exploração de petróleo na bacia da foz do Rio Amazonas causou profundo e grave conflito de interesses entre o Ministério do Meio Ambiente e a Petrobras. A estatal discorda do parecer técnico do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que recomendou a não liberação de licenciamento ambiental à perfuração de poço petrolífero no chamado bloco 59, distante 139km da costa do Oiapoque, no Amapá.
O presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, declarou que a bacia da foz do Amazonas tem extrema sensibilidade socioambiental. Na região, estão unidades de conservação, terras indígenas, mangues, formações biogênicas de organismos como corais e esponjas. Além disso, abriga espécies ameaçadas de extinção, como boto-cinza, boto-vermelho, cachalote e baleia-fin.
A posição do instituto ganha realce ao identificar que o plano da estatal não dispõe de Avaliação Ambiental da Área Sedimentar, como impõe a Portaria nº 198/2012, dos ministérios do Meio Ambiente e de Minas e Energia, o que leva à insegurança técnica e jurídica. Não há dados sobre os impactos socioambientais nas comunidades indígenas. O plano da estatal também não aponta quais ações em caso de acidente, como derrame de óleo, seriam adotadas em um área com correntes marítimas fortes e endêmicas de espécies ameaçadas de extinção. A Petrobras, por sua vez, compara o potencial petrolífero da região — 14 bilhões de barris — ao do pré-sal.
O interesse da estatal em explorar petróleo na margem equatorial, que se estende até o Rio Grande do Norte, tem estreita relação com o sucesso alcançado pela antiga Guiana Francesa, um dos mais pobres países da região e vizinha de Roraima. A Guiana obteve um crescimento econômico de 62%, no último ano, com a exploração de petróleo no mar.
Igual lógica valeria para a Amazônia, que abriga expressiva parcela de brasileiros de baixo poder aquisitivo. No entanto, o plano da Petrobras sinaliza um distanciamento da tendência global de substituir os combustíveis fósseis por fontes de energia limpa, renovável e sustentável.
Embora a atividade da Petrobras seja legal e tem relevante importância para a economia brasileira, o embate tem relação com o impacto que a prospecção de petróleo causará numa região tão sensível e onde as populações indígenas, quilombolas e outras têm sofrido devido às ações predatórias que afetam o ambiente. Em boa medida, as mazelas sociais, econômicas e ambientais são produto da ausência de políticas públicas e de estímulos equivocados que levam à destruição da maior riqueza da Amazônia: o patrimônio florestal e mineral, explorados de forma criminosa.
A mineração do ouro, defendida como "salvação da pátria", nem de longe passou perto do progresso desejado. Tornou-se um ativo disputado pelo crime organizado, com a escravização de vários brasileiros, iludidos pela possibilidade inalcançável de riqueza rápida. O ouro negro, hoje pivô de conflitos políticos e de interesses, pode contribuir para elevar a fragilidade socioambiental da região, que vem sendo esgotada pelas intervenções humanas ilegais.
O governo brasileiro, por sua vez, ficaria desacreditado ante as nações desenvolvidas, por não cumprir o compromisso de conter a barbárie dominante na Amazônia Legal, a maior floresta tropical do planeta, considerada como essencial para mitigar o aquecimento global. Mais do que romper com uma promessa, o Estado brasileiro daria uma demonstração de incompetência para construir um modelo econômico sustentável, que garanta a preservação do patrimônio natural e, ao mesmo tempo, assegure qualidade de vida à população.
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