Maurício Antônio Lopes - Pesquisador da Embrapa
Há exatos 10 anos, a organização inglesa Trucost, especializada na análise do uso de recursos naturais pelas empresas, publicou o estudo Capital natural em risco: as 100 principais externalidades dos negócios, com a conclusão de que as principais indústrias do mundo não seriam lucrativas se pagassem pelo capital natural que usam. O estudo estimou que as maiores indústrias globais gastavam US$ 7,3 trilhões em capital natural por ano, uma das principais razões pelas quais conseguiam ter lucro.
Uma década depois, os setores industriais do mundo seguem consumindo quantidades crescentes de capital natural não precificado — como ar, água potável, solo e biodiversidade — recursos finitos já muito escassos em vários lugares. Em 2020, o Global Footprint Network calculou ser necessário 1,6 planeta como o nosso para suprir toda a demanda da humanidade, evidência de que a capacidade regenerativa do planeta já foi excedida, com esgotamento de recursos naturais a taxas que colocam em risco a sustentação futura da vida na Terra.
Essa realidade coloca em evidência o conceito de "externalidades" que, na dimensão ambiental, se refere aos custos gerados por atividades econômicas que afetam o meio ambiente e a saúde humana, mas que não são refletidos nos preços dos produtos ou serviços associados a essas atividades. Por exemplo, as empresas que produzem bens que geram emissões poluentes podem causar danos à saúde humana, à biodiversidade e ao clima, gerando custos que não são suportados diretamente por essas empresas ou pelos consumidores dos seus produtos e serviços.
São inúmeros os casos em que custos gerados por atividades, negócios e produtos insustentáveis são externalizados para outras atividades econômicas, a sociedade em geral, ou para as gerações futuras — enquanto o mais justo seria atribuir tais passivos àqueles diretamente responsáveis pela sua produção. Entre os passivos mais significativos, estão a degradação ambiental e a poluição, com enormes impactos negativos no bem-estar e na saúde humana, que hoje oneram a sociedade como um todo.
Em geral, os setores que dependem diretamente dos recursos naturais ou que fornecem serviços que são diretamente afetados pela degradação ambiental estão mais expostos aos custos externalizados por atividades insustentáveis. O turismo, que é uma importante fonte de renda para muitas regiões e países, é altamente dependente de recursos naturais, como paisagens, praias, parques e reservas naturais. A degradação ambiental e a mudança climática podem desgastar tais recursos, com redução do potencial turístico e da renda gerada pelo setor.
A pesca é outro setor altamente dependente de recursos naturais, como os estoques de peixes e o ambiente marinho. Atividades insustentáveis como a pesca excessiva, a degradação dos habitats e a poluição podem afetar a produtividade, a qualidade dos produtos e a viabilidade financeira dos pescadores e das indústrias do setor. Da mesma forma, a agricultura insustentável pode levar à degradação do solo, ao esgotamento dos recursos hídricos e ao uso excessivo de pesticidas e fertilizantes, que podem contaminar o meio ambiente, afetar a saúde humana e comprometer a segurança alimentar no futuro.
Uma das dificuldades na gestão de muitas das externalidades ambientais é a sua dimensão global e persistência, uma vez que seus impactos podem alcançar grandes áreas e perdurar por gerações. Exemplo mais marcante é o aquecimento global, causado principalmente pela emissão de gases de efeito estufa decorrente das atividades humanas. Outro exemplo é a contaminação de rios e oceanos com plásticos, poluição que pode persistir por longos períodos, afetando a vida marinha e prejudicando as comunidades que dependem dos recursos naturais desses ecossistemas.
Abordagens simplistas para gerenciar a nossa riqueza natural — como as que defendem externalidades como algo inevitável — têm levado à subvalorização e à exploração desmedida dos recursos naturais, com custos ambientais subestimados ou ignorados. Situações que não deverão perdurar na medida em que crescem em toda a sociedade os clamores pela sustentabilidade, com muitos governos e reguladores exigindo que as empresas internalizem os custos do capital natural e se adaptem a um ambiente regulatório mais restritivo.
Mudanças que requerem investimentos e alterações significativas na forma como as empresas operam. Inevitável, pois, reconhecer que as empresas não poderão fazer essas mudanças sozinhas - o envolvimento de governos e sociedade civil é fundamental para promover e apoiar a transição para sistemas industriais verdadeiramente sustentáveis. Isso exigirá uma mudança fundamental no pensamento e na prática empresarial, bem como uma colaboração significativa entre empresas, governos e sociedade civil.
É cada vez mais necessário que os governos criem políticas públicas que estimulem a adoção de práticas empresariais sustentáveis, como incentivos fiscais para empresas que adotam tecnologias limpas, regulamentação ambiental rigorosa e a promoção de parcerias público-privadas para projetos sustentáveis. A educação e conscientização pública também se tornarão cada vez mais importantes para incentivar a demanda por produtos e serviços sustentáveis e criar uma cultura de consumo consciente.
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