O ex-presidente Jair Bolsonaro desembarcou no Brasil há exatos 36 dias, depois de uma temporada de três meses nos Estados Unidos. E, desde então, vivencia algo inédito nas últimas décadas: investigação em várias frentes e a falta de um mandato político. Afinal, desde que entrou para a vida pública em 1988, quando se elegeu vereador no Rio de Janeiro, perdeu apenas uma disputa eleitoral, a do ano passado.
A mais recente delas, a apuração da fraude em cartões de vacina — já apelidada de vacinagate —, é vista com cautela por boa parte da classe política, mas reavivou o clima de polarização do período eleitoral do ano passado. Nas redes sociais, por exemplo, uma análise do Instituto Quaest mostra que 81% das menções foram favoráveis à operação desencadeada pela Polícia Federal. Entre os apoiadores do ex-presidente, a palavra mais citada foi "perseguição".
E aí surge um grande problema: a polarização cega as pessoas. Não faz bem para o debate reduzir a política a um maniqueísmo total. As investigações em andamento contra Bolsonaro não têm ligação nenhuma com as realizadas pela Operação Lava-Jato contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ao reduzir a realidade para um embate Lula x Bolsonaro, a capacidade de análise passa a ser guiada pela emoção.
De volta ao vacinagate, as provas apresentadas até agora pela Polícia Federal são muito contundentes contra o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. Se o ex-presidente teve participação ou não, é uma outra história. Mas é difícil crer que Cid agiu por conta própria para fraudar documentos públicos em nome de Bolsonaro e da filha de 12 anos. O que ele ganharia com isso, por exemplo?
É interessante relembrar que o mesmo Cid esteve envolvido em outro episódio nebuloso no apagar das luzes do governo Bolsonaro: a carteirada frustrada no Aeroporto de Guarulhos, quando ele tentou retirar as joias sauditas, avaliadas em R$ 16,5 milhões, que estavam retidas pela Receita Federal. Com acesso livre ao Planalto durante os quatro anos da gestão Bolsonaro, Cid aparece como personagem central dos dois escândalos enfrentados pelo ex-presidente desde que ficou sem mandato.
Cabe à Polícia Federal esmiuçar a relação entre Cid e Bolsonaro. Os próximos capítulos serão decisivos. A ver.
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