violência

Artigo: Por uma escola segura

"Mamãe e papai, não chorem por mim. Sempre estarei com vocês. Sempre que verem um sorriso de uma criança, estarei nele. Ou quando ouvirem, ao longe, a algazarra da infância, a mesma que tiraram de mim. Estarei na alegria dos pequenos, no olhar inocente e tão cheio de vontade de viver, no carrinho deixado sobre a minha estante, na boneca ainda dentro da caixa, na bola que nunca joguei. Estarei em meu quartinho e na minha escola. Quando quiserem chorar, fechem os olhos e ouçam o passarinho. Serei eu, tocando o seu espírito e acalmando sua dor. Papai e mamãe, isso se chama amor. Tive que voltar para minha outra casa mais cedo. Não sinto dor nem medo. Espero que tenham uma vida longa. Estarei sempre com vocês. Esperarei o dia de recebê-los com um abraço forte e um beijo. Papai e mamãe, como o céu é lindo!"

Escrevi essas linhas, sem conter as lágrimas, uma semana atrás, poucas horas depois que um homem usou uma machadinha para assassinar quatro crianças em uma creche de Blumenau (SC). Não consigo dimensionar a dor desses pais. Não consigo entender como o ser humano mergulha nas trevas e comete um ato tão repugnante. Nesses 18 anos de trabalho no Correio Braziliense, perdi as contas de quantas notícias demos sobre massacres em escolas nos Estados Unidos. Conversei com pais de vítimas de tiroteios em massa e com testemunhas. Também entrevistei Loren Coleman, um sociólogo norte-americano que criou o conceito de "efeito copycat" (ou "efeito contágio") para descrever o fenômeno de repetição de massacres. Ontem, um estudante de uma escola de Santa Tereza de Goiás feriu colegas a facadas.

Há algo de muito podre na sociedade norte-americana e que, infelizmente, começa a se disseminar pelo Brasil: a cultura do ódio, a normalização da violência e da intolerância. Nos Estados Unidos, esse comportamento é fomentado pelo fácil acesso a armas de fogo, inclusive fuzis de alto poder destrutivo. O culto às armas está respaldado pela Segunda Emenda à Constituição e pelo poderoso lobby da Associação Nacional do Rifle (ANR). Cada congressista dos EUA tem as mãos sujas de sangue por se recusar a resistir à pressão da indústria armamentista e ao não criar leis mais restritivas de acesso às armas.

No Brasil, é hora de pensar em reforço de segurança nos estabelecimentos de ensino e na valorização da patrulha escolar. Mas também é urgente uma ampla discussão sobre como o ódio foi banalizado, especialmente depois de eleições presidenciais tão polarizadas, que chegaram a estremecer, ou mesmo romper, os laços de famílias. Precisamos, o quanto antes, de uma educação para cultura de paz. Antes que sejamos obrigados a ver mais pais chorando a partida de seus filhos.

Mais Lidas