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EDUCAÇÃO

Artigo: Um ensino médio de qualidade para todos. É possível?

Especialista afirmam que a sala de aula precisa ir além do combate à violência nas unidades -  (crédito:  Reprodução/Redes Sociais)
Especialista afirmam que a sala de aula precisa ir além do combate à violência nas unidades - (crédito: Reprodução/Redes Sociais)
postado em 16/04/2023 06:00

Claudia Costin - Diretora do Centro de Políticas Educacionais da FGV, foi diretora global de educação do Banco Mundial

Desde o início do ano, discussões sobre o novo ensino médio vêm ocorrendo de forma acalorada, parecendo colocar em um dos polos a revogação pura e simples da lei que o instituiu em 2017 e, no outro, sua mera manutenção tal como lograram implantar. Num país que se tornou polarizado e que viveu um período em que políticas educacionais não ganhavam relevância, é tentador associar a primeira alternativa à esquerda e a segunda à direita, sem enxergar quaisquer nuances nas duas abordagens.

Para poder entender melhor o debate, que foi modificado quando o ministro da educação e o próprio presidente, ao noticiarem a suspensão do cronograma de implementação do novo ensino médio para que se possa escutar as diferentes propostas vindas das escolas, anunciaram que não haverá revogação, é importante entender o que era o ensino médio até as medidas legais começarem a ser postas em prática.

O ensino médio tinha, até então, um ensino em que cerca de 13 matérias eram espremidas em quatro horas diárias de aula. Ou seja, o aluno adquiria um verniz de cada uma delas e não aprendia a pensar historicamente, matematicamente ou cientificamente (como, aliás, ficou claro na participação do Brasil no Pisa, prova internacional aplicada pela OCDE para jovens de 15 anos). Para efeito de comparação, os melhores sistemas educacionais não só contam com uma jornada escolar de 7 a 9 horas diárias, como escolhem uma área de aprofundamento.

Não por acaso, o Ideb (índice brasileiro que mede tanto a permanência dos alunos na escola e seu progresso para a série seguinte, quanto sua aprendizagem) de ensino médio vinha se mantendo num patamar baixíssimo, de 3,5 para as escolas públicas, enquanto avanços ocorriam nas outras etapas de escolaridade, em especial nos anos iniciais do ensino fundamental.

Neste sentido, algo deveria ser feito e, de fato, desde a gestão de Haddad no MEC, discussões e propostas nesse sentido vinham ocorrendo, até o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG) elaborar um projeto de lei introduzindo a ideia de itinerários formativos tal como expresso na medida provisória preparada depois pelo então ministro Mendonça Filho que, posteriormente, transformou-se na lei do novo ensino médio.

Na lei, havia um prazo para que as redes se preparassem e as escolas pudessem iniciar a implementação. Com a crise da covid-19, optou-se por retardar o início e, há cerca de dois anos, a proposta vem sendo implementada em todos os estados da Federação. No entanto, o MEC, no governo anterior, não assumiu seu papel na coordenação da implementação. Com isso, houve falta de diretrizes para a definição dos itinerários, de formação adequada dos professores para o novo modelo, de adaptação da infraestrutura e de monitoramento da prática.

Dois anos depois, o que é necessário fazer? A meu ver, agiu corretamente o ministro ao propor um grupo de trabalho para buscar entender como as coisas se passam em cada estado e nas diferentes escolas, verificar o que merece ser replicado e o que definitivamente não funcionou e demanda, nesse sentido, modificações profundas ou, em alguns casos, aperfeiçoamentos.

Uma pesquisa aplicada entre jovens do ensino médio, no fim de 2022, mostrou que cerca de 92% dos jovens gostariam de ter, como seus colegas de outros países, áreas de aprofundamento para escolher, depois de expostos ao conjunto das disciplinas. Faz bastante sentido e corresponde ao que estabelece, em essência, a reforma.

Mesmo assim, é fundamental ouvir mais sugestões de professores, gestores educacionais e de alunos, e que essa escuta ocorra sem polarizações, incorporando os aprendizados ocorridos ao se colocar a lei em prática e, sobretudo, evitando de jogar a criança junto com a água do banho. Ninguém deseja voltar ao sistema falido anterior, de quatro horas de aula para 13 ou mais matérias. Não será fácil avançar. Há inúmeras dificuldades logísticas e melhorias necessárias, mas educação de qualidade demanda esforço de todos. Afinal, temos um país a construir.

 


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