Enquanto as atenções e olhares se voltam para a Floresta Amazônica, o cerrado está sendo destruído pela supressão da vegetação. No primeiro mês deste ano, o desmatamento no Piauí (9,5 mil hectares) e na Bahia (9,3 mil hectares) revelou um crescimento de 88% em relação a janeiro de 2022. Os dois estados trafegam na contramão das sete outras unidades da Federação do bioma, que, juntas, derrubaram 46,5 mil hectares de cobertura vegetal, 16% menos em relação aos 55,3 mil hectares em igual período do ano passado, embora seja um recuo insuficiente. Os dados são do Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD) Cerrado, desenvolvido pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) em parceria com a rede MapBiomas e com o Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento da Universidade Federal de Goiás.
Ao longo do ano passado, o bioma perdeu mais de 8.155 km² de cobertura vegetal. Em dezembro, foram desmatados 839km², quase o dobro dos 444km² do ano anterior, o que surpreendeu, devido às chuvas na região que dificultam essas ações.
Sem vegetação não há água. Sem água não há vegetação, ensinam os especialistas. O cerrado é reconhecido como o berço das águas, por abrigar nascentes que alimentam oito das 12 bacias hidrográficas no país. As intervenções predatórias tendem a comprometer a oferta de água, não só no Centro-Oeste, mas em outras regiões do país.
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A bióloga e professora da Universidade de Brasília (UnB), hoje na presidência da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Mercedes Bustamante, advertiu que a situação é grave em entrevista à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Segundo ela, a vegetação nativa foi substituída pelas lavouras de soja e pela pecuária, uma situação preocupante, "porque já perdemos metade da área da cobertura vegetal nativa do cerrado".
Mas não só isso. O aquecimento global não exclui o Centro-Oeste e tem impactado a região, a começar pela queda no volume de chuvas. De acordo com a professora Mercedes Bustamante, o cerrado está mais quente e mais seco, reflexo das mudanças no clima A alteração foi citada no último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). O documento acrescentou que a região continuará esquentando.
Além do aquecimento que afeta a produção de alimentos e a pecuária, países da União Europeia, engajados nas ações destinadas a mitigar o aquecimento global, estão decididos a restringir a importação de produtos de áreas de desmatamento, e não só da Amazônia. Para isso, trabalham no rastreamento da origem das mercadorias.
Os alertas para que haja uma relação amigável com o meio ambiente não vem só dos fenômenos climáticos extremos, como o ocorrido em São Sebastião, litoral norte de São Paulo. Eles são emitidos também pelo universo dos negócios, considerando o peso da agropecuária na balança comercial do país. Uma economia verde, orientada pelos conceitos de sustentabilidade, se tornou uma exigência do mundo civilizado que tem apreço pela vida no planeta. Mais do que nunca, o governo e os empresários brasileiros têm que rever a política ambiental, a fim de acompanhar a tendência global.
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